Apresentação

Espaço para a apresentação e análise de estudos e pesquisas de alunos da UFRJ, resultantes da adoção do Método de Educação Tutorial, com o objetivo de difundir informações e orientações sobre Química, Toxicologia e Tecnologia de Alimentos.

O Blog também é parte das atividades do LabConsS - Laboratório de Vida Urbana, Consumo & Saúde, criado e operado pelo Grupo PET-SESu/Farmácia & Saúde Pública da UFRJ.Nesse contexto, quando se fala em Química e Tecnologia de Alimentos, se privilegia um olhar "Farmacêutico", um olhar "Sanitário", um olhar socialmente orientado e oriundo do universo do "Consumerismo e Saúde", em vez de apenas um reducionista Olhar Tecnológico.

domingo, 4 de dezembro de 2011

Leite de Soja: Alternativa ao leite?




Atualmente, como todos os grãos, a soja vem sendo explorada para fins preventivos e curativos no que se refere à saúde. O Soymilke, produto alimentício a base de soja é um dos mais famosos e utilizados, sendo o Soymilke Omega um produto lácteo rico em vitaminas, cálcio e ômega 3 e 6. A partir disso, as indicações feitas para esse alimento tangem não só as propriedades da soja como também dos ingredientes adicionados tais como prevenção de osteoporose e câncer. Será que simplesmente a adição desses ingredientes permite que sejam oferecidas a esse produto as indicações referentes aos mesmos? Ainda que sim, será que as concentrações são suficientes para alcançar tal objetivo ou ainda sim o leite de vaca integral é mais vantajoso? E o que garante que existe de fato soja dentro do alimento e não simplesmente a adição de componentes desse grão?

Por Felipe Alves


INTRODUÇÃO:
Produtos a base de soja vêm sendo comercializados com o intuito de se adicionar esse grão à alimentação da população, já que o mesmo não é muito apreciável, mas rico em nutrientes. É constituído principalmente de isoflavonas e proteínas. O Soymilke Ômega, alimento lácteo de soja rico em vitaminas e cálcio da indústria Olvebra, entra no mercado como uma alternativa ao leite.
Esse produto é indicado para pessoas que se preocupam com a saúde e bem estar, e através da alimentação previnem-se de problemas futuros ligados ao coração, a longevidade e a integridade óssea. Também é utilizado em casos de intolerância à lactose, alergia à proteína do leite, por celíacos, naturalistas em geral e diabéticos. Seus benefícios tangem a prevenção de osteoporose, doenças crônico-degenerativas como câncer de mama, cólon de útero e próstata, problemas futuros ligados ao coração e idade, ação antioxidante e atenua efeitos da menopausa.
Será que simplesmente a adição desses ingredientes permite que sejam oferecidas a esse produto as indicações referentes aos mesmos? Ainda que sim, será que as concentrações são suficientes para alcançar tal objetivo ou ainda sim o leite de vaca integral é mais vantajoso? E o que garante que existe de fato soja dentro do alimento e não simplesmente a adição de componentes desse grão? Para isso, é necessária uma análise dos componentes no que se refere à identidade e quantidade/concentração e inter-relação entre os mesmos.

FUNDAMENTOS BROMATOLÓGICOS:
A tabela nutricional de Soymilke Ômega está descrita abaixo:


A soja é um grão que contém muitos nutrientes; cada qual com sua funcionalidade. Alguns exemplos estão mostrados abaixo:
Proteínas: Auxiliam na diminuição dos níveis de colesterol, pois a alta relação Arg/Lys pode diminuir a secreção de insulina e glucagon, inibindo a lipogênese; Auxiliam, também, na diminuição da excreção urinária de cálcio, provavelmente devido ao menor conteúdo de aminoácidos sulfurados.
Isoflavonas: Auxiliam na deposição de cálcio na matriz óssea; prevenção do câncer de mama.
Ácido fítico: Controle da diabetes
Vitamina E: Prevenção de câncer e auxilia na longevidade.
Ômega 3 e ômega 6: São lipídeos poliinsaturados considerados essenciais por não serem produzidos pelo nosso organismo. Contribuem principalmente para a diminuição da lipoproteína LDL e triglicerídeos e aumentam a lipoproteína HDL no plasma. Isso acarreta na diminuição de possíveis problemas cardíacos relacionados a acúmulo de gordura nos vasos.
O cálcio é um mineral presente principalmente nos ossos, cerca de 90%, regulado pelo paratormônio (PHT), hormônio produzido pela glândula paratireóide. Os outros 10% estão relacionados com as funções celulares que o cálcio promove como contração muscular a partir da sua liberação do retículo sarcoplasmático nas células musculares, ativação de quinases dependentes de fosforilação a partir da via da proteína Gq, dentre outras. Sua absorção depende de outras substâncias que podem induzir o aumento (ex.: Vitamina D) ou diminuição (ex.: Fibras alimentares) desse fenômeno.

REVISÃO BIBLIOGRÁFICA:
Basicamente, a soja é destacada como um alimento extremamente nutritivo, mas que não é muito apreciado pela população. As formas encontradas para a adição desse grão na alimentação seriam utilizando flavorizantes e edulcorantes para modificação de odor e sabor (alguns processos já patenteados) ou, até mesmo, a não adição da soja, e sim somente a introdução de alguns componentes que a constituem, variando de acordo com o objetivo da formulação.
Alguns autores qualificam a soja como um ingrediente não recomendado quando presente o cálcio, pois o ácido fítico diminui a deposição de cálcio na matriz óssea, a presença de fibras e interação com proteínas desse grão que diminuem a absorção do cálcio. Ao mesmo tempo, outros autores afirmam que não há problemas referentes à absorção e deposição de cálcio associado a alimentos a base de soja.
Quanto aos lipídeos adicionados ao Soymilke, os trabalhos obtidos expressam a sua funcionalidade benéfica quanto aos distúrbios cardiovasculares, mas deixam clara a possibilidade de surgimento de problemas quando há uma ingesta acima do recomendado, tais como promoção de Mal de Alzheimer, derrame, osteoporose, etc.

LEGISLAÇÃO:
Devido ao aumento da produção de alimentos classificados como funcionais, foi necessária a criação de normas que viabilizassem a produção e comercialização desses produtos. No Brasil, a Comissão de Assessoramento Técnico em Alimentos Funcionais e Novos Alimentos (CTCAF) criou uma resolução sobre o tema, entre as quais aquela que estabelece as diretrizes para utilização da alegação de propriedades funcionais e/ou de saúde.
Para alimentos a base de soja, a regulamentação é ditada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) pela RDC nº 91, de 18 de outubro de 2000 - Regulamento Técnico para Fixação de Identidade e Qualidade de Alimento Com Soja, na qual veda a utilização do termo “Leite de Soja” para produtos lácteos que contém soja como fonte principal de proteínas. Define, também, a quantidade necessária de cada aminoácido comparando com o leite de vaca, uma informação importante para determinar se é ou não um alimento capaz de substituir a ingesta de leite de vaca. Porém, não há informação sobre o Soymilke ômega no que se refere as quantidades de cada aminoácido presente, o que descarta a possibilidade de comparação.

DISCUSSÃO
O Soymilke Ômega contém extrato de soja em pó. Para tal, os valores protéicos encontrados devem ser acima de 40% (da SILVA, C.R.). Observando que as quantidades adicionadas ao produto dos outros ingredientes (Cálcio e Vitaminas) não são suficientes para promover diluição (Volume aparente não significativo) de proteínas, a concentração das mesmas se apresenta abaixo do valor recomendado – 30,77%. Isso pode ser oriundo de uma pré-diluição do extrato ou simplesmente a adição de proteínas da soja (ou não) sem, de fato, a presença do grão ao produto. Em compensação, a quantidade de proteínas é superior a encontrada nos leites integrais em pó, que correspondem a 6,6g a cada 26g de leite.
Em relação às isoflavonas, de acordo com o descrito no site da Olvebra, a quantidade desses flavonóides é de 45,76mg por porção (26g). Sabe-se que, para atingir um valor com atividade preventiva de câncer, são necessários 25mg/dia dessas isoflavonas (LAZARY, V. M. D.). As quantidades, portanto, contidas no produto são suficiente para caracterizá-lo como indicado para prevenção.
Os ômegas 3 e 6, presentes naturalmente na soja e no extrato seco adicionado ao produto Soymilke Ômega (vide site da Olvebra), não existe valores diários para ingesta além de não ter sido encontrado valores referentes desses lipídeos na soja.
Sobre o cálcio, existem algumas indagações. A indicação do Soymilke Ômega para pacientes com osteoporose deve ser analisada já que essa alegação depende não só do cálcio presente, mas também das concentrações de magnésio, fósforo e vitamina D. Para que seja eficaz, as concentrações dessas espécies devem ser de 2 para Ca/Mg e entre 1 e 1,5 para Ca/P e uma concentração de 5µg/dia de vitamina D. Enquanto o magnésio e vitamina D são responsáveis pela deposição de cálcio nos ossos, o fósforo em demasia enfraquece os ossos. Analisando os valores de magnésio e cálcio, os valores estão discrepantes (Ca/Mg 5,66). Entretanto, para cálcio e fósforo, os valores estão no limite ideal (Ca/P 1,14). Para a vitamina D, não existe adição dessa vitamina, que é indispensável para que haja tal efeito. Não se pode dizer, então, que o produto em si possua caráter preventivo da osteoporose, mas, com a adição de alimentos contendo Magnésio e vitamina D, a indicação seria válida.
Em um estudo (HEANEY), foi verificada se havia diferenças entre a biodisponibilidade de cálcio pelo leite de vaca com o leite de soja. Foi observado que, adicionado 300mg de cálcio marcado nos dois leites e distribuídos para os indivíduos-teste, a quantidade encontrada no plasma foi menor para o leite de soja, devendo assim, aumentar essa quantidade presente nesse para se equiparar ao leite de vaca, chegando a 500mg. Além disso, a forma como essa espécie se apresenta (citrato de cálcio, cloreto de cálcio,...) varia quanto a biodisponibilidade, tendo que ser revelada a sua forma.

CONCLUSÃO:
Aparentemente, o produto Soymilke Ômega da Olvebra alega algumas funcionalidades do produto que devem ser revistas, visto que as recomendações nutricionais e/ou científicas descritas diferem dos valores que esse produto possui. Além disso, a legislação poderia ser mais específica quanto às indicações e determinações para alimentos considerados funcionais.
Os valores nutricionais, apesar de não serem adequados para algumas indicações, são relativamente não prejudiciais, podendo esse produto ser adicionado a uma dieta equilibrada, porém não deve ser um produto de substituição ao leite de vaca, uma vez que alterações quanto a concentração e biodisponibilidade de alguns componentes nesses “leites” são diferentes e vice-versa.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
CHIARELLO, M. D. A soja e os alimentos funcionais: oportunidades de parcerias em P&D para os setores público e privado. Revista Parcerias Estratégicas. n.15, editora CCGE, 2002.
Ministério da Saúde. ANVISA. Consulta Pública nº 80, de 13 de dezembro de 2004. D.O.U de 17/12/2004.
TEVES, C. C., DIWAN, D., de ALMEIDA, J. A. Leites Modificados. Universidade de São Paulo. Faculdade de Ciências Farmacêuticas. 2008. São Paulo.
United States Patent – US 7,147,878 B2. Modified Soy Products and Methods For Reducing Odor And Improving Flavor Of Soy Products. 2006.
SIMOPOULOS, A. P., LEAF, A., SALEM, N. Workshop on the Essentiality of and Recommended Dietary Intakes for Omega-6 and Omega-3 Fatty Acids. Conference Report. Journal of the American College of Nutrition. v. 18, n. 5, p. 487-489, 1999.
http://www.olvebra.com.br/pt/produtos/familia.asp?famId=16
http://www.oligopharma.com.br/oligoelementos/
HEANEY, R. P., et al. Bioavailability of the calcium in fortified soy imitation milk, with some observations on method. American Journal of Clinical Nutrition. n. 71, p.1166-1169, 2000.
RDC nº 91, de 18 de outubro de 2000
D.O.U de 20/10/2000
Da Silva, C. R. Desenvolvimento de um produto análogo ao queijo minas frescal elaborado com leite de cabra e extrato de soja. Mestrado em Ciências dos Alimentos. Universidade Federal de Lavras. 2010. Minas Gerais.
RDC nº. 268, de 22 de setembro de 2005.
LAZARY, V. M. D. Efeitos do consumo da isoflavona na prevenção do câncer de mama. Curso de especialização e promoção da saúde. Brasília. 2010.
CASÉ, F., et al Production of calcium enriched soymilk. Ciência e Tecnologia de Alimentos. 2005. Campinas.
Tabela Brasileira de Composição de Alimentos – TACO. Versão 2. 2ª Ed. 2006. Campinas.

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