Apresentação

Espaço para a apresentação e análise de estudos e pesquisas de alunos da UFRJ, resultantes da adoção do Método de Educação Tutorial, com o objetivo de difundir informações e orientações sobre Química, Toxicologia e Tecnologia de Alimentos.

O Blog também é parte das atividades do LabConsS - Laboratório de Vida Urbana, Consumo & Saúde, criado e operado pelo Grupo PET-SESu/Farmácia & Saúde Pública da UFRJ.Nesse contexto, quando se fala em Química e Tecnologia de Alimentos, se privilegia um olhar "Farmacêutico", um olhar "Sanitário", um olhar socialmente orientado e oriundo do universo do "Consumerismo e Saúde", em vez de apenas um reducionista Olhar Tecnológico.

domingo, 4 de dezembro de 2011

Análise do prazo de validade do requeijão tipo cremoso


Por Rafael Maciqueira e Rafaella Rebecchi

O requeijão é um produto tipicamente brasileiro, que possui, como ingrediente básico, o leite e, de acordo com a Portaria n.º 359, de 4 de setembro de 1997 do Ministério da Agricultura, o produto só pode ser reconhecido dessa forma se for "obtido pela fusão da massa coalhada, cozida ou não, dessorada e lavada, obtida por coagulação ácida e/ou enzimática do leite opcionalmente adicionada de creme de leite e/ou manteiga e/ou gordura anidra de leite ou butter oil. O produto poderá estar adicionado de condimentos, especiarias e/ou outras substâncias alimentícias."


A qualidade de um produto pode ser avaliada principalmente a partir de 3 aspectos: características organolépticas (cor, odor e aparência), físico-químicas e microbiológicas (presença de bolores, bactérias).

Ao se comprar um requeijão deve-se atentar principalmente para a existência de sinais de alteração das embalagens, como, por exemplo, estufamento, e quaisquer modificações físicas (como mudança na consistência), químicas (mudança de coloração) ou ainda organolépticas (mudança de cor, odor ou sabor), que evidenciem deterioração do produto.

O Padrão de Identidade e Qualidade (PIQ) de um produto é o conjunto de características qualitativas e/ou quantitativas que define a qualidade aceitável do produto ou processo, para os fins a que se destina. Sendo assim, para ser comercializado, o requeijão deve atender aos parâmetros definidos no PIQ, garantindo assim a identidade e as características mínimas de qualidade do produto.

De acordo com o Padrão de Identidade e Qualidade de Requeijão (PIQ), estabelecido pela Portaria nº 359, de 04 de setembro de 1997, do Ministério da Agricultura, o requeijão deve atender aos requisitos constantes na tabela abaixo.

Requisito

Requeijão

Requeijão Cremoso

Requeijão de Manteiga

Matéria gorda no
extrato seco g/100g

45,0 a 54,9

Mín. 55,0

25,0 a 59,9

Umidade g/ 100g

Máx. 60,0

Máx. 65,0

Máx. 58,0

O prazo de validade estipulado para o requeijão, seja esse de balde (3,6kg), bisnaga (aprox. 1,5kg) ou ainda pote pequeno de vidro ou plástico (220g), é de aproximadamente 55 dias (mantido sob baixa temperatura), sendo que após aberto deve ser consumido em até 8 dias. Entretanto, por ser um produto perecível esse valor pode variar bastante de acordo com condições de uso e armazenamento.

Assim sendo, nesse trabalho, procuramos avaliar a influência de diferentes modos de uso e armazenamento na validade de um requeijão de mesma marca, ou seja, analisar o tempo necessário para que o produto apresente características que marcam a alteração de sua qualidade de acordo com o seu modo de utilização. Além disso, comparar os diferentes dados coletados sobre marcas variadas deste produto, apresentando uma visão crítica e elucidativa em relação aos fatores associados ao prazo de validade, desde a sua produção, comercialização e consumo.

Caracterização:

A aprovação do Regulamento da Inspeção Industrial e Sanitária de Produtos de Origem Animal é dada pelo decreto nº 3.748, de 12 de julho de 1993, no qual o requeijão é caracterizado com alguns de maneira adequada, conforme a seguir.

I - formato: cilíndrico ou retangular;
II - peso: 250 (duzentos e cinquenta) a 1.000 g (mil gramas);
III - crosta: nítida, fina de cor branco-creme;
IV - consistência: mole, homogênea;
V - textura: fechada ou com olhos em cabeça de alfinete;
VI - cor: branco-creme homogênea.

Quanto aos seus constituintes, são aceitos, segundo o Regulamento Técnico do Mercosul de Identidade e Qualidade do requeijão, os aditivos dispostos na tabela abaixo.

Aditivos

Função

Conc. Máx.

Acido Sórbico ou seus sais de Na, K ou Ca

Conservador

1000mg/kg só ou combinados expressa como ácido sórbico

Natamicina (na superficie)

Conservador

1 mg/dm2

Máx. 5 mg/kg não detetável a 2 mm de profundidade.

Ausência na massa

Nisina

Conservador

12,5 mg/kg

Acidos láctico, cítrico, acético e malico ou seus sais da Na, K, Ca.

Bicarbonato de sódio

Reguladores de acidez

b.p.f.

Citratos de Na, K, Ca

Lactatos de Na ou Ca

Tartaratos de Na e/ou K.

Fosfatos ou polifosfatos de Na, K ou Ca

Emulsionantes/ estabilizantes

40 g/kg só ou combinados com fosfatos ou polifosfatos calculados como substâncias anidra sempre que os fosfatos não superem 20 g/kg expressos em P205

Aromas

Saborizante/ aromatizante

b.p.f.

Caratenóides naturais: Beta Caroteno

Corante

b.p.f.

Bixina, Norbixina, Urucum, Anato, Rocu

Corante

10 mg/Kg como norbixina

Beta caroteno sintético idêntico ao natural

Corante

600mg/kg

Clorofila, clorofilina, clorofila cúprica, sais de Na ou K

Corante

15 mg/kg em clorofila

Peróxido de benzoilo

Corante

20 mg/l de leite

Riboflavina

Carmin

Vermelho de beterraba

Dióxido de titânio

Corante

b.p.f.

Alterações:

Um requeijão cremoso de boa qualidade, assim como qualquer queijo processado, deve apresentar-se com superfície brilhante, lisa e sem arenosidade. Os defeitos podem ser decorrentes do processamento inadequado, destacando-se homogeneização insuficiente, excesso ou falta de aquecimento, escolha e/ ou quantidade errada de sais emulsificantes.

Dentre os defeitos resultantes da adição incorreta de sais fundentes destacam-se o desenvolvimento de sabor amargo e a formação de cristais.

Quanto aos defeitos decorrentes da contaminação microbiana, a formação de gás é percebida poucas semanas após o envase e, normalmente, estão associadas ao desenvolvimento de microrganismos esporogênicos fermentadores de açúcar Clostridium tyrobutiricum e Clostridium sporogenes.

Ainda, como defeito correlacionado com mau processamento encontra-se o escurecimento não enzimático, que se caracteriza por um defeito de cor resultante da temperatura e /ou tempo excessivo de aquecimento da massa para a fusão.

Validade do produto:

Visando um melhor entendimento sobre a real situação do produto, tanto em nível de consumo quanto a nível comercial, alguns dados foram coletados referentes a marcas distintas de requeijão em um supermercado da cidade do Rio de Janeiro.

Marca

Tipo

Validade

Embalagem

Conservantes

Indicações de uso

A

Tradicional

2 meses e meio

Vidro com tampa lacrada

Sorbato de potássio e nisina

-Manter resfriado de 1 a 10oC.

-Não congelar.

-Após aberto, consumir em 8 dias.

B

Light

2 meses e meio

Plástico fechado com folha de alumínio e tampa

Ácido sórbico e nisina

-Manter resfriado de 1 a 10oC.

-Após aberto, consumir em 8 dias.

C

Sabor cheddar

3 meses

Plástico fechado com folha de alumínio e tampa

Sorbato de potássio e nisina

-Manter resfriado de 1 a 10oC.

-Após aberto, consumir em 8 dias.

D

Tradicional

2 meses e meio

Fôrma

Sorbato de potássio

-Manter resfriado de 4 a 10oC.

-Após aberto, consumir em 8 dias.

E

Tradicional

2 meses e meio

Fôrma

Sorbato de potássio

-Manter resfriado até 10oC.

-Após aberto, consumir em 8 dias e mantê-lo tampado.

F

Tradicional

3 meses

Plástico fechado com folha de alumínio e tampa

Sorbato de potássio

-Manter resfriado até 10oC.

-Após aberto, consumir em 8 dias.

G

Tradicional

6 meses

Vidro com tampa lacrada

Sorbato de potássio

-Manter resfriado de 1 a 10oC.

-Após aberto, consumir em 8 dias.

H

Tradicional

2 meses

Sachê

Sorbato de potássio

-Manter resfriado de 1 a 10oC.

-Após aberto, consumir em 8 dias.

É valido ressaltar que todos os produtos apresentavam número de registro e inspeção do Ministério da Agricultura.

A partir da análise dos resultados obtidos, é possível observar que grande parte das marcas apresentaram prazo de validade na faixa de 2 a 3 meses, conforme prazo padronizado pelas instituições competentes de 55 dias. Cabe, portanto, um questionamento em relação a marca que apresentou prazo estipulado de 6 meses.

Todas as marcas indicavam o correto uso do produto, com consumo no período de 8 dias após aberto e faixa de temperatura a ser armazenado. Apenas 2 marcas apresentaram informações um pouco mais detalhadas ou ratificaram o que havia sido exposto em outra parte da embalagem: marca E com “ após aberto, manter tampado” e marca F com “o produto mantém suas características se for mantido na temperatura indicada no rótulo”.

Uma série de questionamentos podem ser levantados a partir do exposto acima. Quanto ao armazenamento, a principal dúvida é se diferentes formas de embalagem gerariam distintos tempos de consumo após aberto.

Como exemplo, um recipiente de vidro, após ter seu lacre retirado, fica com a tampa apenas encostada (perde completamente o poder de vedação). Outra dúvida é em relação ao modo como se deve armazenar saches, tendo em visto que não possuem tampa. Os recipientes de plástico com películas de alumínio devem ser armazenados com ou sem as películas? Infelizmente, nenhuma dessas respostas foram encontradas no modo de uso de qualquer uma das marcas.

Uma crítica interessante a ser feita é quanto ao pequeno tamanho da fonte utilizada nas mensagens dos produtos. Isto é um fator chave no entendimento de consumidores diversos, principalmente idosos.

Aos olhos do consumidor, talvez a embalagem mais prática e que visualmente melhor proteja o produto seja a fôrma.

Por ser um produto culturalmente posto à mesa durante os lanches, a temperatura, após aberto, a qual o produto é submetido não é condizente com a temperatura ideal descrita nos rótulos. Consequentemente, há a possibilidade do período de consumo ser menor do que o demonstrado nas embalagens, ou seja, 8 dias. Isto poderia acarretar em alteração de qualidade quanto a sabor, consistência e outros fatores, além de crescimento microbiano.

Alguns cuidados devem ser tomados para garantir um consumo adequado. O requeijão em copo deve apresentar a massa branca e cremosa por igual, não havendo separação entre a parte cremosa e a líquida ou estufamento da tampa, indicando fermentação. No caso de requeijão aberto em casa, não introduzir talheres já em uso, evitando possíveis contaminações.

Os cuidados não se resumem apenas a educação dos consumidores. Tanto os transportadores quanto os estabelecimentos de venda devem garantir que o produto seja armazenado em condições devidas, um problema ainda existente e que necessita de constante fiscalização.


Um outro aspecto envolvido na validade é o mercado de especialidade láctea, que vem crescendo com o decorrer dos anos devido à possibilidade de introdução de ingredientes que não são permitidos no Regulamento para Requeijão e, através destas pequenas alterações, é possível obter um produto com características muito próximas ao do verdadeiro requeijão, seja ele o cremoso ou o de copo. ESTE mercado não apresenta um regulamento técnico próprio informando quais os aditivos permitidos e seus limites máximos.
Para as especialidades lácteas tipo requeijão a gama de aditivos e ingredientes permitidos é bem maior.


A ampla variação de produtos existente no mercado é devido à falta de uma normatização para padronizar esta nova categoria de produtos.


Anexo I: Fabricação do Requeijão Cremoso

O requeijão é um produto fabricado praticamente em todo o território nacional, com algumas variações de tecnologia e características de região para região. Dentre os requeijões comercializados no Brasil, destaca-se o requeijão cremoso como o mais tradicional e de amplo consumo.

Na elaboração de requeijão cremoso, empregam-se como matéria-prima o leite e/ ou leite reconstituído. Dentre as espécies, o leite de vaca é o mais utilizado, apesar de ser possível elaborar este produto a partir de leite de cabra e de leite de búfala.

A qualidade do leite empregado exerce forte influência no processamento e nas características básicas desses produtos, no que se refere aos atributos de aparência, consistência, textura, sabor, aroma, bem como na sua vida útil, sendo praticamente impossível obter produto de excelente qualidade a partir de matéria-prima de má qualidade.

Uma vez obtida a matéria-prima, parte-se para a elaboração da massa, que será submetida à fusão com a adição dos demais ingredientes para a fabricação do requeijão cremoso.

A massa, assim obtida, é submetida à moagem, que possibilita o contato íntimo do sal fundente com a mistura da massa durante o processamento, seguida da adição dos ingredientes e o processo de fusão propriamente dito. A gordura, na forma de creme de leite e/ou manteiga e/ou gordura anidra de leite, é ingrediente obrigatório na elaboração de requeijão cremoso, uma vez que o produto deve apresentar, no mínimo, 55% de gordura no extrato seco , e deve ser adicionada antes da fusão, onde a quantidade dependerá do teor de gordura desejado.

O cloreto de sódio normalmente é adicionado na proporção de 1,5% - 2,0% em relação à massa a ser fundida, na forma de solução ou mesmo polvilhada sobre a mesma.

A água desempenha importante papel no processamento tecnológico do requeijão, uma vez que auxilia na dissolução dos sais emulsificantes, na hidratação das proteínas e na dispersão dos componentes.

Em geral, utilizam-se dois sais fundentes, comumente na forma de mistura, os citratos dissódicos e trissódicos em solução aquosa, que originam queijo firme ao corte, e os fosfatos, mais comum polifosfato que monofosfato e difosfato, que apresentam bom poder de dispersão, de tal maneira que os processos de hidratação se desenvolvem com rapidez e uniformemente.

O processo de cremificação leva a uma elevação da viscosidade devido à hidratação das proteínas e ao aumento das interações protéicas.

O produto deve ser rapidamente resfriado a uma temperatura inferior a 100C, embora isto possa levar a formação de cristais.

Referências bibliográficas

DRUNKLER, D. A. Produção de requeijão cremoso simbiótico. Universidade Federal do Paraná. Curitiba, 2009.

Decreto nº 3.748, de 12 de julho de 1993.

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