Apresentação

Espaço para a apresentação e análise de estudos e pesquisas de alunos da UFRJ, resultantes da adoção do Método de Educação Tutorial, com o objetivo de difundir informações e orientações sobre Química, Toxicologia e Tecnologia de Alimentos.

O Blog também é parte das atividades do LabConsS - Laboratório de Vida Urbana, Consumo & Saúde, criado e operado pelo Grupo PET-SESu/Farmácia & Saúde Pública da UFRJ.Nesse contexto, quando se fala em Química e Tecnologia de Alimentos, se privilegia um olhar "Farmacêutico", um olhar "Sanitário", um olhar socialmente orientado e oriundo do universo do "Consumerismo e Saúde", em vez de apenas um reducionista Olhar Tecnológico.

domingo, 1 de novembro de 2020

ENGOV AFTER - Possui seu consumo seguro por adolescentes?

 


O engov after realmente vai te dar o “UP” para aguentar os bloquinhos de carnaval, ou vai te levar mais cedo para o hospital?



DESCRIÇÃO


     Engov After é uma bebida de 250 mL, disponível nos sabores Citrus, Tangerina e Berry Vibes, comercializada pela marca Engov como suplemento alimentar líquido. Esta bebida pode ser encontrada em supermercados e farmácias, promete um "up" por recuperar os eletrólitos e líquidos perdidos, e reenergizar o corpo durante a atividade intensa, por possuir em sua formulação glicose, cafeína e sais minerais.  A marca ENGOV lançou e distribuiu este produto no carnaval como estratégia de marketing para o público conhecer e experimentar a novidade no pré, durante e pós-carnaval, prometendo aos foliões um  “up” e horas a mais para curtir nos blocos.

A necessidade dos tempos atuais de se manter mais ativo e acordado por mais tempo em virtude do excesso de gasto energético durante uma festa, atividade física ou uma rotina pesada, tem estimulado o consumo exagerado de bebidas que prometem uma recuperação rápida, principalmente entre os jovens e praticantes de atividades esportivas. Essas bebidas possuem  em sua composição sais minerais, carboidratos e estimulantes do Sistema Nervoso Central: cafeína, guaraná, taurina, entre outros.  Apesar dos estimulantes possuírem função de aumentar a concentração, produtividade e tirar a sensação de cansaço, podem ser tóxicos ao organismo dependendo da quantidade ingerida durante o dia, sendo a dose segura dependente das faixas etárias e doenças crônicas pré-existente.

Como forma de esclarecer a dúvida sobre a segurança do consumo do Engov After por adolescentes, será feita uma análise da composição nutricional a luz das Resoluções da Diretoria Colegiada (RDC) publicadas para suplementos alimentares e a quantidade segura da cafeína sugerida pela ANVISA, considerando faixa etária e os efeitos colaterais de uma intoxicação. 


FUNDAMENTOS BROMATOLÓGICOS


Informação Nutricional

Porção 250 mL (1 garrafa)

Quantidade por porção

%VD*

Valor energético

84 kcal = 353 kJ

4

carboidratos

21 g

7

Sódio

140 mg

6

Cafeína

100 mg

**

Não Contém quantidades significativas de proteínas, gorduras totais, gorduras saturadas, gordura trans e fibra alimentar

*Valores Diários com base em uma dieta de 2.000 Kcal ou 8400kJ. Seus valores diários podem ser maiores ou menores dependendo de suas necessidades energéticas.  ** Valor diário não estabelecido

Ingredientes: água, sacarose, maltodextrina, glicose monohidratada, citrato trissódico dihidratado, cloreto de sódio, cafeína, aromatizante, regulador de acidez: ácido cítrico, acidulante: ácido tartárico, conservadores: sorbato de potássio e benzoato de sódio e edulcorantes: acesulfame de potássio e sucralose.

Tabela 1. Composição Nutricional do ENGOV AFTER

 

             Em uma dose do produto, garrafa de 250 mL, contêm 100 mg de cafeína, 21g de carboidratos e 140 mg de sódio, Tabela 1. Durante as atividades, a perda de líquidos, eletrólitos e o alto gasto energético é a causa principal da fadiga e cansaço. Os carboidratos do produto, representado pela sacarose, maltodextrina e glicose monohidratado, têm como função repor os substratos energético, enquanto os sais minerais, citrato trissódico dihidratado e cloreto de sódio, fornecem íons que participam na manutenção da pressão osmótica dos fluidos corporais. A adição de sódio à água aumenta a absorção de fluidos, o que ocorre em maior proporção na presença de carboidratos. 

O estimulante do SNC do produto, que tem como função diminuir a sensação de fadiga, é a Cafeína.  A cafeína é um metabólito secundário, um alcaloide púrico da classe das trimetilxantina, produzido por algumas plantas. Suas principais fontes são café, mate, chá-da-índia, cola, cacau e guaraná. A cafeína exerce uma ação inibitória sobre os receptores do neurotransmissor adenosina, redutor da frequência cardíaca, da pressão sanguínea e da temperatura corporal. Muitas das respostas fisiológicas com a administração de cafeína são opostas às de adenosina, por isso há uma sensação de revigoramento, diminuição do sono e fadiga. A cafeína exerce um efeito sobre a descarga das células nervosas e a liberação de alguns outros neurotransmissores e hormônios, tais como a adrenalina. Essas ações podem causar efeitos taquicardizantes, broncodilatadores, diuréticos e estimulantes da secreção gástrica. Em doses maiores, produz excitação, ansiedade, insônia e diurese excessiva.

 

LEGISLAÇÃO

 

Os atos normativos aplicáveis ao produto são: RDC nº 243/2018, que dispõe sobre os requisitos sanitários dos suplementos alimentares; IN nº 28/2018, que estabelece as listas de constituintes, de limites de uso, de alegações e de  rotulagem  complementar  dos  suplementos  alimentares; RDC nº 239/2018, que estabelece os aditivos alimentares e coadjuvantes de tecnologia autorizados para uso em suplementos alimentares; RDC nº 27/2010, que dispõe sobre as categorias de alimentos embalagens isentos e com obrigatoriedade de registro sanitário – Atualizada pelas RDC nº 240/2018; a RDC Nº 360/ 2003; Regulamento Técnico Sobre Rotulagem Nutricional De Alimentos Embalados;

Analisando a rotulagem do produto, observou-se que este seguiu com as normas da RDC Nº 360/ 2003 e RDC nº 239/2018 de rotulagem. Porém, percebe-se que o rótulo não seguiu com os dispostos da RDC nº 243/2018 e IN N° 28/2018 em relação à cafeína, que determinam que a rotulagem dos suplementos alimentares devem conter quantidade, frequência de consumo e o percentual de valor diário (%VD) para cada um dos grupos populacionais, ter limites máximos estabelecidos de forma a reduzir o risco de consumo excessivo, além de considerar as evidências científicas relativas aos limites superiores de segurança, às especificidades do grupo populacional a que se destinam e às quantidades consumidas através de outras fontes alimentares. O rótulo do produto não dispõe da faixa etária do grupo populacional, determina apenas como adultos. Não possui o percentual de valor diário (%VD) da cafeína, estando declarado no rótulo como “valor diário não estabelecido”. Apesar da marca respeitar o limite máximo de consumo pelos suplementos alimentares na recomendação diária da IN N° 28/2018 de 200mg, essa pode ser consumida apenas pelo grupo populacional ≤ 19 anos e que não possui pressão alta, arritmia, doenças cardiovasculares ou úlceras no estômago. Além disso, a marca não considera às quantidades consumidas através de outras fontes alimentares

 

DISCUSSÃO


      A dose existente cafeína no Engov After seria capaz de trazer malefícios a saúde?  E o seu uso concomitante como outros alimentos consumidos durante o dia-dia, como café, chocolates e guaraná?  A quantidade tóxica para um adulto é a mesma para um adolescente? E o consumo em blocos de carnaval, pode ser ainda mais perigoso?

    A cafeína é encontrada em diversas bebidas, tendo o café como uma fonte bastante consumida entre a população brasileira. A revista Mayo Clinic informou que uma  xícara de café (240 mL) pode variar entre 95 - 200 mg. E a IN N° 28/2018,  estipulou uma dose máxima recomendável de 200 mg para o grupo populacional maior de 19 anos, saudáveis. Sendo assim, se o consumo concomitante do Engov After com o café, já ultrapassaria a dose recomendável para maiores 19 anos, saudáveis, para menores de 19 anos e com doenças crônicas, a dose segura da cafeína seria ainda mais ultrapassada. 

     De acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente, lei Nº 8.069, DE 13 DE JULHO DE 1990: “ considera-se criança a pessoa até doze anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade.” O rótulo do produto não especifica a faixa de idade do grupo populacional, apenas cita em recomendações que é para "adultos" e que não deve ser consumido por gestantes, lactantes e crianças, porém não alerta o seu uso por adolescentes e por pessoas com problemas cardiovasculares. Sendo assim, esse uso inconsciente e a falta de informações sobre doses tóxicas da cafeína, podem levar a efeitos adversos da estimulação do SNC e dos efeitos inotrópicos excessivo: palpitações, convulsões, dores de cabeça e efeitos taquicardizantes, broncodilatadores, diuréticos e estimulantes da secreção gástrica.

    Além disso, observou-se  recentemente a crescente ingestão de bebidas alcoólicas com bebidas energéticas. Estas bebidas vêm sendo utilizadas para potencializar os efeitos das bebidas alcoólicas, devido, possivelmente, a uma redução dos efeitos depressores do álcool pela ação estimulante da cafeína. Porém, o consumo de bebidas com cafeína e álcool não é recomendável, pois a cafeína potencializa o efeito do álcool e diminui a percepção de embriaguez, levando a ingestão de mais bebida, aumentado assim , a chance de uma intoxicação alcoólica.

 

CONCLUSÃO

 

Em suma, as informações que se encontram ausentes no rótulo, como percentual de valor diário (%VD) e faixa etária do grupo populacional, são de extrema importância, já que produtos contendo cafeína são tão presentes na dieta dos brasileiros e seu consumo exagerado pode levar efeitos adversos perigosos de uma intoxicação, dependendo da faixa etária e estado de saúde do consumidor. Além disso, o consumo em excesso de cafeína, pode levar efeitos contrários aos benéficos propostos pela marca, já que pode causar desidratação e um maior gasto energético. Sendo assim, o consumidor deve estar sempre atento ao rótulo, à tabela nutricional e estar bem esclarecido sobre a dose diária recomendável de cafeína, a fim de evitar uma intoxicação.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

ANVISA. RDC Nº 243, DE 26 DE JULHO DE 2018. Dispõe sobre os requisitos sanitários dos suplementos alimentares. 
Disponível em: https://www.in.gov.br/materia/-/asset_publisher/Kujrw0TZC2Mb/content/id/34379969/do1-2018-07-27-resolucao-da-diretoria-colegiada-rdc-n-243-de-26-de-julho-de-2018-34379917. Acesso em: 04/10/2020
 
ANVISA. IN N° 28, DE 26 DE JULHO DE 2018. Estabelece as listas de constituintes, de limites de uso, de alegações e de rotulagem complementar dos suplementos alimentares. 
Disponível em: https://www.in.gov.br/materia/-/asset_publisher/Kujrw0TZC2Mb/content/id/34380639/do1-2018-07-27-instrucao-normativa-in-n-28-de-26-de-julho-de-2018-34380550. Acesso em: 04/10/2020
 
ANVISA. RDC Nº 239, DE 26 DE JULHO DE 2018. Estabelece os aditivos alimentares e coadjuvantes de tecnologia autorizados para uso em suplementos alimentares. 
Disponível em: https://www.in.gov.br/materia/-/asset_publisher/Kujrw0TZC2Mb/content/id/34380515/do1-2018-07-27-resolucao-da-diretoria-colegiada-rdc-n-239-de-26-de-julho-de-2018-34380387. Acesso em: 04/10/2020
 
ANVISA. RDC Nº 27, DE 6 DE AGOSTO DE 2010. Dispõe sobre as categorias de alimentos e embalagens isentos e com obrigatoriedade de registro sanitário. 
Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/anvisa/2010/res0027_06_08_2010.html. Acesso em: 04/10/2020
 
ANVISA. RDC Nº 240, DE 26 DE JULHO DE 2018 Altera a Resolução - RDC nº 27, de 6 de agosto de 2010, que dispõe sobre as categorias de alimentos e embalagens isentos e com obrigatoriedade de registro sanitário. 
Disponível em: https://alimentusconsultoria.com.br/wp-content/uploads/2018/07/RESOLU%C3%87%C3%83O-DA-DIRETORIA-COLEGIADA-RDC-N%C2%BA-240-DE-26-DE-JULHO-DE-2018-Di%C3%A1rio-Oficial-da-Uni%C3%A3o-Imprensa-Nacional.pdf. Acesso em: 04/10/2020
 
ANVISA.  DC Nº 360, DE 23 DE DEZEMBRO DE 2003.  Regulamento Técnico sobre Rotulagem Nutricional de Alimentos Embalados.  
Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/anvisa/2003/rdc0360_23_12_2003.html. Acesso em: 04/10/2020
 
Engov After. Disponível em: https://www.engovafter.com.br/#produtos. Acesso em: 31/10/2020.
 
Sociedade Brasileira de Farmacognosia. Alcaloides púricos. 
Disponível em:http://sbfgnosia.org.br/Ensino/drogas_com_alcaloides_puricos.html. Acesso em: 31/10/2020.
 
Mayo Clinic Staff. Caffeine content for coffee, tea, soda and more.  
 
Casa Civil. LEI Nº 8.069, DE 13 DE JULHO DE 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências. 
Disponível Em:ttp://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm#:~:text=Art.%202%C2%BA%20Considera%2Dse%20crian%C3%A7a,e%20um%20anos%20d%20idade. Acesso em: 31/10/2020.
 
Harvey RA, Champe PC. Farmacologia ilustrada. 2ª ed. Porto alegre: ArtMed; 1998. Goodman & Gilman. As bases farmacologicas da terapêutica. 10ª ed. Rio de Janeiro: McGraw Hill; 2005.
 
CARVALHO, Joelia Marques et al. Perfil dos principais componentes em bebidas energéticas: cafeína, taurina, guaraná e glucoronolactona. 
Disponível em: http://periodicos.ses.sp.bvs.br/pdf/rial/v65n2/v65n2a02.pdf. Acesso em: 31/10/2020.
 

8 comentários:

  1. Conteúdo de muita relevância para saúde pública. Pois este produto é vendido até mesmo em supermercados, em que não é destacado os riscos a saúde devido a alta concentração de cafeína por dose. Parabéns a autora e a todos os alunos da disciplina de Bromatologia da UFRJ por fornecerem informações de extrema importância para a saúde pública.

    ResponderExcluir
  2. Trabalho bem feito, linguagem acessível, explicações didáticas e de extrema importância,pois informa a população em geral sobre os riscos do alto consumo de substâncias tóxicas deste produto. Rótulos e tabelas de informação nutricional podem ser complicadas de ser entender e cheias de armadilhas para o consumidor, por isso é muito gratificante e fundamental que existam trabalhos acadêmicos como esse dos alunos de Bromatologia da UFRJ. Ainda mais de forma acessível as pessoas para que nos informe e proteja dos abusos e artimanhas que indústrias e empresas utilizam cotidianamente para burlar a legislação e enganar seus consumidores em prol do lucro.

    ResponderExcluir
  3. Trabalho muito necessário. Parabéns à todos envolvidos na pesquisa!

    ResponderExcluir
  4. Que trabalho ótimo! Super necessário!

    ResponderExcluir
  5. Excelente trabalho. Muito informativo e claro na sua linguagem de comunicação, facilitando o entendimento total das informações presentes na pesquisa. Esse tipo de conteúdo é muito importante, porém pouco discutido. Gostaria de parabenizar a autora e os demais alunos de Bromatologia da UFRJ pelo excelente trabalho, e também ao professor responsável por estimular e instigar uma pesquisa tão relevante e importante sobre saúde pública, principamente nos dias atuais.

    ResponderExcluir
  6. Belo trabalho! Super informativo e importante. Além de falar sobre o mal que pode fazer o uso de um produto que é conhecido, falou da melhor forma possível. Parabéns aos alunos envolvidos!

    ResponderExcluir
  7. Muito importante falar sobre isso. Ótimo texto

    ResponderExcluir
  8. Trabalho incrível e de extrema importância! Ótimo texto e de fácil compreensão. Parabéns a todos os envolvidos!

    ResponderExcluir