Apresentação

Espaço para a apresentação e análise de estudos e pesquisas de alunos da UFRJ, resultantes da adoção do Método de Educação Tutorial, com o objetivo de difundir informações e orientações sobre Química, Toxicologia e Tecnologia de Alimentos.

O Blog também é parte das atividades do LabConsS - Laboratório de Vida Urbana, Consumo & Saúde, criado e operado pelo Grupo PET-SESu/Farmácia & Saúde Pública da UFRJ.Nesse contexto, quando se fala em Química e Tecnologia de Alimentos, se privilegia um olhar "Farmacêutico", um olhar "Sanitário", um olhar socialmente orientado e oriundo do universo do "Consumerismo e Saúde", em vez de apenas um reducionista Olhar Tecnológico.

terça-feira, 3 de novembro de 2020

Bromatologia, legislação e substituição do leite materno

  


O leite materno é insubstituível e disso todos têm certeza. Mas existem algumas dificuldades que se apresentam no meio do caminho e não permitem o acesso desse leite a todas as crianças, então o que fazer? Como definir o produto ideal para se enquadrar nessas características? Como regulamentar essa comercialização?

Descrição

        Na tentativa de solucionar as questões de ausência do leite materno foram criadas as formulas infantis na intenção de substituir pelo menos em partes o leite materno. A partir de então nasceu um outro problema, que é definir quais são as características bromatológicas essenciais que enquadram um produto na categoria de formula infantil e como regulamentar essa comercialização, na medida em que interesses comerciais tem que ser freados quando entram em desacordo com medidas básicas de saúde. Algumas definições bromatológicas, legislações e suas fragilidades podem ajudar a compreender melhor a importância de uma boa regulamentação e como os consumidores podem se sentir resguardados de certas ações abusivas por parte das empresas que comercializam esse tipo de produto.

Fundamentos Bromatológicos

          É importante que o substituinte do leite materno inclua nutrientes básicos essenciais, como hidratos de carbonoproteínas e gorduras, bem como água para o manter hidratado. Compreender a composição do leite materno mesmo que não de uma maneira completa é essencial para a escolha de infant formulas que estejam adequadas aos padrões do que elas se propõe a substituir. O leite materno é composto por milhões de células vivas que incluem glóbulos brancos, que reforçam o sistema imunitário e células estaminais, que podem ajudar no desenvolvimento e regeneração dos órgãos. Mais de 200 açúcares complexos denominados oligossacarídeos que atuam como prebióticos, fatores de crescimento que sustentam o desenvolvimento saudável, diversos hormônios reguladores de atividade, vitaminas e minerais, anticorpos conhecidos como imunoglobulinas, ácidos graxos de cadeia longa que porque têm um papel crucial no desenvolvimento do sistema nervoso dos bebês, além de microRNAs envolvidos na regulação da expressão gênica.  


Legislação

A RDC 360 de 23 de Dezembro de 2003 dispõe sobre rotulagem nutricional o que é de extrema importância quando se trata desta regulamentação de produtos para lactentes que tenham embasamento bromatológico. Os destaques de algumas definições dessa RDC são importantes para se compreender até onde realmente as informações que vem no rotulo são de fato esclarecedoras sobre o protudo que está contido na embalagem. Além disso vale a pena se debruçar sobre a portaria 977 de 5 de Dezembro de 1998 que discorre sobre definições de formulas infantis e de minímos e máximo que são pré-estabelecidos para tais onde pode-se debruçar sobre os verdadeiros princípios bromatológicos por tras dessas definições. A RDC 222 de 5 de Agosto de 2002 também é bem interessante na medida em que é importate para delimitar limites comerciais que são a maior parte da problemática, na medida em que são divulgados conceitos sem embasamento bromatológico e que muitas vezes estimulam as mães a comprar a fórmula infantil acreditando ser mais nutritiva que o próprio leite materno. É importante destacar que essa definições e medidas são em sua maioria inspiradas em recomendações da OMS e estão presentes no Codex Alimentarius 

Discussão e Conclusão

Até que ponto as leis regulamentares desses produtos estão realmente delimitando uma área de atuação? Pode-se perceber que algumas legislações não tem em si uma preocupação de definir o leite materno bromatologicamente para que se faça um comparativo na produção dos substituintes. A construção de uma legislação mais eficaz é essencial para o desenvolvimento saudável de crianças que por algum motivo não tiveram acesso ao leite materno. 

Um claro exemplo de inadequação é percebido na ausência de uma regulamentação clara dos constituintes necessários para que aquele produto seja definido como formula infantil. A definição dada pela portaria 977 é: “Considera-se Fórmula Infantil para Lactentes o produto em forma líquida ou em pó, destinado a alimentação de lactentes, sob prescrição, em substituição total ou parcial do leite humano, para satisfação das necessidades nutricionais deste grupo etário. Excetuam-se as fórmulas destinadas a satisfazer necessidades dietoterápicas específicas.” Essa definição apresenta de forma abrangente o enquadramento de fórmulas infantis que deixa a desejar alguns aspectos técnicos que se apresentam essenciais como alguns constituintes básicos do leite materno que são possíveis de serem exigidos nas formulações. Alguns açucares, proteínas, ácidos graxos de cadeia longa, vitaminas e minerais são essenciais e estão na lista de nutrientes que não podem faltar as formulas, no entanto alguns baixas obrigatoriedades baseadas somente nas quantidades e não na qualidade e especificidade dos nutrientes são aberturas legislativas. Um exemplo é a composição essencial de proteínas que diz: “Deve conter no mínimo 1,8g por 100 kcal disponíveis (ou 0,43g por 100 kJ disponíveis) de proteína de qualidade nutricional equivalente à da caseína ou maior quantidade de outra proteína em proporção inversa ao seu valor biológico. A qualidade da proteína não deve ser inferior a 85% da caseína. A quantidade total de proteína não deve exceder a 4g por 100 kcal disponíveis (ou 0,96g por 100 kl disponíveis).”, em que é possível perceber a ausência de uma definição clara do tipo de proteína, já que essa equivalência abre um grande espaço para possíveis jogos de palavras que permitam a comercialização de produtos de menor qualidade. Certas exigências, na medida do desenvolvimento tecnológico, são possíveis de estar presentes como itens obrigatórios dessas formulas e não se apresentando como diferenciais comerciais.

A partir desse ponto entra-se em outra questão delicada que são as possibilidades de divulgação dessas formulas e até que pontos elas estão de acordo com uma normatividade que seria aceitável, tendo em vista a importância da primeira alimentação do ser humano. A RDC 222 que regulamenta esses aspectos é bem incisiva em algumas definições, mas deixa espaço para que algumas outras questões similares sejam potenciais riscos na indução de compra de produtos não qualificados para tal necessidade. O exemplo claro é o impedimento de “Utilizar fotos, desenhos ou outras representações gráficas, que não sejam aquelas necessárias para ilustrar métodos de preparação ou uso do produto, entretanto é permitido o uso de marca do produto/ logomarca desde que não utilize imagem de lactente , criança pequena, ou outras figuras humanizadas.” Apesar de serem importantes proibições, ainda assim não fica claro o que são essas figuras humanizadas deixando abertura para desenvolvimento de influencia na venda de produtos que seriam de exclusividade da prescrição.

Tendo como base esses exemplos fica claro, portanto, a necessidade de se repensarem alguns conceitos com detalhes mais técnicos na medida em que certas aberturas podem ser crucias na saúde dos consumidores. Pode-se pensar também em como uma legislação de certo modo mais branda para esse tipo de produto pode ser prejudicial, já que com os tipos de nutrientes que deveriam ser exigidos em uma formula infantil fariam de tal um produto não mais somente alimentício mas também farmacêutico. Na medida em que dose, tipo de nutrientes e qualidade podem fazer extrema diferença no desenvolvimento da saúde, talvez valesse a pena uma maior dureza de legislação enquadrando as formulas infantis no grupo de produtos farmacêuticos.

Referências Bibliográficas

INFANT FORMULAingredientes, mimetizações, signos e mercado - Marcia dos S. Dias e Luiz Eduardo R. de Carvalho.

Nutracêutico: Do definir ao regulamentar - Luiz Eduardo Carvalho e Mirian Ribeiro Leite Moura.

 

https://www.medela.com.br/amamentacao/jornada-da-mae/composicao-do-leite-materno

 

http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/anvisa/2003/rdc0360_23_12_2003.html

 

http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/anvisa/2002/res0222_05_08_2002.html#:~:text=Regulamentar%20a%20promo%C3%A7%C3%A3o%20comercial%20e,e%20crian%C3%A7as%20de%20primeira%20inf%C3%A2ncia.&text=como%20um%20substituto%20parcial%20ou%20total%20do%20leite%20materno%20e%20ou%20humano.

 

http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/svs1/1998/prt0977_05_12_1998_rep.html

 

https://unidospelavida.org.br/symdekoanvisa/

 

https://www.rmmg.com.br/post/leite-materno-pode-ser-usado-no-tratamento-para-a-covid-19

 

https://www.iso.org/news/ref2308.html


Nenhum comentário:

Postar um comentário