Descrição
Alimentos zero açúcar ou sem adição de açúcar vêm ocupando cada vez mais espaço nas prateleiras de alimentos nos supermercados. Podemos encontrar gelatinas, shakes, achocolatados, doce de leite, biscoitos, geleias, chocolates, e vários outros produtos com um desses dois selos.
Esses produtos são utilizados por pessoas que desejam ou precisam reduzir a ingestão de açúcar e carboidratos em sua refeição. Seja para reduzir o valor energético total consumido, por necessidade metabólica ou para seguir uma dieta com baixo teor de carboidrato. É possível observar que vários destes produtos apresentam a maltodextrina, um carboidrato proveniente do amido, como um de seus principais ingredientes. O objetivo deste trabalho é analisar se a adição de maltodextrina é coerente em um alimento rotulado como sem açúcar.
Fundamentos bromatológicos
Carboidratos são poli-hidroxialdeídos ou poli-hidroxicetonas, e todas as substâncias que geram esses compostos quando hidrolisadas. Também são chamados de sacarídeos, uma palavra derivada do grego (sakcharon) que significa açúcar. Sendo assim, todo carboidrato é um sacarídeo e um açúcar, e vice-versa.
São classificados de acordo com o número de poli-hidroxialdeídos ou poli-hidroxicetonas presentes na sua estrutura. Os monossacarídeos são as moléculas mais simples, têm apenas um núcleo, e são representados pela glicose, frutose, galactose. Os oligossacarídeos são os carboidratos com 2 a 6 unidades de monossacarídeos, o mais conhecido é o dissacarídeo, representado pela sacarose, maltose, lactose. Os polissacarídeos são polímeros formados por diversas unidades de monossacarídeo, os mais conhecidos são o amido, glicogênio e celulose (ambos formados por unidades de glicose).
A maltodextrina é um produto obtido da hidrólise parcial do amido, que pode ser proveniente de diversos vegetais como o milho, arroz e trigo. É um pó branco levemente adocicado muito utilizado na indústria de alimentos e na indústria farmacêutica. Pode ser utilizado como agente gelificante e espessante, base para adoçantes sólidos, auxiliar em processos de secagem, entre outras funções.
Legislação
A regulamentação sobre alimentos sem açúcar e sem adição de açúcar está presente na RDC n° 54 de 2012. Alimentos sem açúcar são aqueles que não contêm na lista de ingredientes açúcares ou ingredientes que sejam entendidos como alimentos com açúcares. É permitida a presença de até 0,5 g de açúcar por porção do alimento para que ele utilize este rótulo.
Estes alimentos são destinados a dietas com restrição de carboidratos ou dietas com ingestão controlada de açúcares, pela portaria n° 29/1998. A dieta com restrição de carboidrato deve conter alimentos restritos em sacarose, frutose e glicose, enquanto a dieta com ingestão controlada de açúcares não deve haver adição de açúcar.
A resolução n° 54/2012 também fornece a definição sobre açúcar segundo a Anvisa. É todo mono e dissacarídeo presente em um alimento, que será digerido, absorvido e metabolizado pelo homem.
Discussão
A maltodextrina é um polímero derivado da hidrólise parcial do amido e apresenta de 5 a 10 unidades de glicose, podendo ser classificada como oligo ou polissacarídeo. As características físico-químicas deste carboidrato variam de acordo com a origem vegetal e com o grau de hidrólise do amido. Quanto mais hidrolisado estiver o amido maior será a concentração de açúcares redutores e doçura do produto.
Quando a maltodextrina é consumida haverá a continuidade da hidrólise enzimática (ação de amilases), rompendo as ligações glicosídicas entre os monossacarídeos. Conforme o carboidrato é digerido há aumento na glicose disponível para ser absorvida, e consequente aumento da glicemia do indivíduo. Por esta absorção ocorrer de forma rápida a maltodextrina é considerada um carboidrato de alto índice glicêmico (semelhante ao da glicose).
A absorção rápida da glicose presente na maltodextrina faz com que o consumo de alimentos que contenham este carboidrato deva ser feito de forma controlada por diabéticos. O consumo excessivo desse tipo de alimento, baseando-se no fato de ser isento de açúcar, pode favorecer quadros de hiperglicemia em diabéticos, agravando sua condição clínica.
Alimentos sem açúcar contendo maltodextrina não são isentos de valor calórico. Como qualquer outro carboidrato a maltodextrina irá fornecer 4 kcal/g de energia, promovendo ganho de peso se for consumido em excesso.
Segundo a legislação sanitária vigente, produtos contendo maltodextrina podem ser rotulados como sem açúcar. Este carboidrato é composto por moléculas de glicose, tem poder adoçante, é capaz de provocar um aumento na glicemia, porém como não se trata de um mono ou dissacarídeo, não é definido como açúcar e pode ser adicionado em produtos sem açúcar. É importante que o consumidor leia as informações contidas na embalagem do produto para estar ciente quanto a presença de maltodextrina, e o que ela pode acarretar na sua saúde.
Vale salientar que o alto índice glicêmico mencionado para a maltodextrina se refere a ingestão de uma solução deste carboidrato. A presença de lipídeos, proteínas, fibras alimentares, e o tipo de processamento do alimento fazem com que a absorção de qualquer carboidrato seja alterada. A resposta glicêmica obtida em uma refeição completa será diferente daquela gerada pela bebida energética e mais realista com uma dieta equilibrada.
Conclusão
Alimentos rotulados como sem açúcar contendo adição de maltodextrina estão de acordo com a legislação estipulada pelo órgão sanitário, pois este carboidrato não é considerado açúcar. Porém, o consumidor deve ser informado que esta substância é um carboidrato com rápida absorção e que pode aumentar sua glicemia. Além disso, por se tratar de um nutriente energético, pode acarretar aumento de peso se for consumido em excesso.
Referências
ANVISA. Agência nacional de vigilância sanitária. Portaria n° 29, de 13 de janeiro de 1998. Disponível em:<http://portal.anvisa.gov.br/documents/10181/2718376/%281%29PRT_SVS_29_1998_COMP.pdf/feffa45e-7dea-4c6d-9cf3-ef92d014490d> Acesso em: 03/10/2020.
ANVISA. Agência nacional de vigilância sanitária. Resolução da diretoria colegiada - RDC n° 54, de 12 de novembro de 2012. Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/anvisa/2012/rdc0054_12_11_2012.html> Acesso em: 03/10/2020.
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MEDEIROS, T. et al. Efeito dose-dependente da maltodextrina na glicemia e resposta cardiovascular em diabéticos tipo 2 durante exercício aeróbico. Revista Brasileira de Nutrição Esportiva, São Paulo. v. 8. n. 45. p.164-170. Maio/Jun. 2014.
NUNES, Renato Moreira, Índice Glicêmico de Formulados contendo Maltodextrina e a Associação de Sacarose com Maltodextrina e seus Efeitos sobre a Ingestão Alimentar em Ratos e Humanos Eutróficos. 2003. 105f. Tese de Doutorado - Universidade Federal de Viçosa, Minas Gerais, 2003.
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