Apresentação

Espaço para a apresentação e análise de estudos e pesquisas de alunos da UFRJ, resultantes da adoção do Método de Educação Tutorial, com o objetivo de difundir informações e orientações sobre Química, Toxicologia e Tecnologia de Alimentos.

O Blog também é parte das atividades do LabConsS - Laboratório de Vida Urbana, Consumo & Saúde, criado e operado pelo Grupo PET-SESu/Farmácia & Saúde Pública da UFRJ.Nesse contexto, quando se fala em Química e Tecnologia de Alimentos, se privilegia um olhar "Farmacêutico", um olhar "Sanitário", um olhar socialmente orientado e oriundo do universo do "Consumerismo e Saúde", em vez de apenas um reducionista Olhar Tecnológico.

sexta-feira, 30 de outubro de 2020

Consumo de Macarrão Instantâneo (miojo) pelo público infantil


                   
         

O alimento a ser discutido no trabalho é o macarrão instantâneo, em que não será levado em consideração os diferentes fabricantes deste alimento, e sim os aspectos visuais das embalagens e informações nutricionais, sobretudo aqueles em que há a presença de personagens de desenhos infantis impressos na embalagem; visto que atrai o público de faixa etária mais baixa. Será que para o consumo infantil, as quantidades declaradas na tabela de informação nutricional estão adequadas para o consumo infantil, isto é, a obtenção dos nutrientes presentes nestes alimentos está de acordo com a ingestão diária máxima recomendada para o público infantil? 

        Descrição do Produto:

            
          O produto em questão trata-se de uma massa alimentícia, cuja formulação contém 80g de massa  e 5g de tempero, feita para ser rapidamente preparado e consumido. Alguns dos rótulos analisados alegam ser fonte de vitaminas B1, B2, B3 e B6. Ambos os produtos possuem quantidades significativas de carboidratos, lipídeos e proteínas.

       Fundamentos Bromatológicos:

       Os carboidratos são as biomoléculas de enorme importância do ponto de vista metabólico, sobretudo a glicose, monômero fundamental para nutrir energeticamente as células, como também para regular diversas etapas do metabolismo celular e energético. A alta ingestão deste macronutriente nos alimentos pode levar ao desenvolvimento de diabetes mellitus tipo 1 (insulino-dependente) e/ou tipo 2 (insulino-resistente) [6].

       Os lipídeos são os macronutrientes de elevado valor calórico, sendo eles popularmente chamados de triglicerídeos, compostos por no máximo 3 unidades denominadas ácidos graxos, unidos por uma molécula de glicerol. Quando os ácidos graxos são liberados na célula, são capazes de suprir muito bem energeticamente as células, mais que os carboidratos. Fisiologicamente, os lipídeos são fundamentais para a produção de hormônios sexuais, como a testosterona; corticoesteroides, por exemplo o cortisol; como também para a formação de mediadores inflamatórios, como as prostaglandinas e leucotrienos. Sua alta ingestão favorece casos de dislipidemia, hipertensão arterial; a curto ou longo prazo, ainda mais quando associada ao ritmo de vida sedentário [6].

        O sódio é um micronutriente fundamental para o balanço hidroeletrolítico, isto é, para a regulação do que entra e sai das células; sendo capaz de regular a propagação do impulso nervoso, contração muscular, secreção de insulina, dentre outras importâncias. Seu alto consumo, o que é visto em todas as faixas etárias, sobretudo as crianças, que ao adquirirem hábitos alimentares ruins; estão associados ao desenvolvimento de resistência à insulina, consequentemente, vir a desenvolver doenças crônicas não transmissíveis, como diabetes mellitus tipo 2; hipertensão arterial [7].

        A tiamina (vitamina B1) é um micronutriente que atua como cofator enzimático em diversas etapas do metabolismo de carboidratos e de aminoácidos de cadeia ramificada, como fenilalanina e triptofano. Sua ingestão inadequada causa a deficiência chamada de beribéri, com o advento da industrialização, sua falta tem-se associado com alcoolismo crônico [8].

       Um estudo feito por unidades de atenção primária à saúde na região sul do Brasil com crianças de 2 a 4 anos e de 5-9 anos de idade, constou a alta prevalência do consumo de alimentos ultra processados, sendo o macarrão instantâneo a segunda maior categoria, responsável por 63,25% das preferências, consumida pelo público infantil [10]. Paralelamente, outro estudo, porém feito no estado do Acre, mostrou que 55% das crianças tinham o hábito de consumir macarrão instantâneo [11].

    Isto indica que a mudança dos hábitos alimentares está ocorrendo de forma brusca e que é de extrema importância uma reeducação alimentar e estimular o consumo de alimentos in natura ou minimamente processados [9].

        Legislação:

        Conforme item 2.1.3 da RDC 93/00, massa alimentícia instantânea é definida como: “o produto não fermentado, apresentado sob várias formas, recheado ou não, obtido pelo empasto, amassamento mecânico, cozimento ou não, desidratação ou não da mistura de farinha de trigo comum e ou sêmola/semolina de trigo e ou farinha de trigo integral e ou farinha de trigo durum e ou sêmola/semolina de trigo durum e ou farinha integral de trigo durum e ou derivados de cereais, leguminosas, raízes ou tubérculos, adicionado ou não de outros ingredientes, e acompanhado ou não de temperos e ou complementos, isoladamente ou adicionados diretamente à massa. Para o preparo, o produto é hidratado a frio ou a quente e o tempo de cozimento é reduzido ou desnecessário”. Na mesma RDC, sobre os requisitos de teor de umidade, conforme item 2.2.1.3, para macarrão instantâneo desidratado por fritura, submetido a cozimento (ou não), deve apresentar umidade máxima de 10% (g/100g); enquanto aqueles que são desidratados por ar quente ou outros meios (com exceção da fritura), devem apresentar umidade máxima de 14,5% (g/100g) [1,5].

    Na codex alimentarius 249-2006, sobre padrões para macarrão instantâneo, no item 3.1.1, sobre ingredientes essenciais da composição deste alimento, deve conter “farinha de trigo e/ou farinha de arroz e/ou outras farinhas e/ou amidos”, como primeira instância e “água”, como segunda instância [5].

     Conforme codex alimentarius 1-1985, sobre padrões de rotulagem de produtos pré-embalados, sobre o nome do alimento, conforme item 4.1.1, o mesmo dever ser indicado com a verdadeira natureza do alimento, sendo específico e não genérico. Segundo o item 4.2.1.4, alimentos e ingredientes conhecidos por causarem hipersensibilidade e reações alérgicas, como trigo, glúten, crustáceos, entre outros, devem constar na lista de ingredientes de forma clara e destacada no rótulo [4].  

     Em relação à RDC 360/03, o item 2.9 define porção como: “quantidade média do alimento que deveria ser consumida por pessoas sadias, maiores de 36 meses de idade, em cada ocasião de consumo, com a finalidade de promover uma alimentação saudável” [2].

     Um ponto a ser discutido trata-se pela ausência de uma categoria (ou sub categoria) de identidade e qualidade de macarrão instantâneo cujas embalagens possuem figuras de personagens infantis, o que acaba atraindo fortemente o público infantil.


Discussão:


 
                                                                                                                           
                                                                               

Analisando os rótulos dos produtos investigados, suas respectivas tabelas de informação nutricional contendo o quantitativo de nutrientes, e comparar com as tabelas quantidade recomendada de nutrientes (Recommended Dietary Allowances ad Adequate Intakes, considerando as faixas etárias 1-3 anos e 4-8 anos de idade) declarados não somente  no alimento em questão (carboidratos, lipídeos - no caso, gorduras totais, proteínas, sódio, tiamina, riboflavina e piridoxina) mas incluindo também outros nutrientes essenciais, os quais não se encontram em nenhum dos rótulos, para o crescimento e desenvolvimento infantis (vitamina A, vitamina K e ferro); observa-se que na porção adotada nos rótulos, a quantidade de carboidratos e proteínas, quando consumidos suprem parcialmente a quantidade recomendada diariamente (130g e 13g para 1-3 anos, 130g e 19g para 4-8 anos, respectivamente); enquanto que a quantidade de sódio, em grande parte dos rótulos, encontra-se em quantidade significativamente maior ao limite recomendável (800mg/dia para 1-3 anos e 1000 mg/dia para 4-8 anos); as vitaminas tiamina, riboflavina, niacina e piridoxina também encontram-se em quantidades superiores aos recomendados, porém ultrapassam levemente tais limites recomendados (0,5mg/dia para 1-3 anos e 0,6mg/dia para 4-8 anos, à tiamina, riboflavina e piridoxina; 6 mg/dia para 1-3 anos e 8mg/dia para 4-8 anos, à niacina) [6, 7, 8].

Portanto; principalmente em relação a quantidade de sódio, este alimento encontra-se antiquado ao consumo infantil, visto que há elevada quantidade deste macronutriente, e que considerando o consumo habitual deste alimento pelas crianças, não havendo incentivos dos pais e familiares ao consumo de alimentos in natura e alimentos minimamente processados, como arroz, verduras, tubérculos; visando a educação alimentar adequada, aliada também ao sedentarismo, aquelas desenvolverão fatores de risco para doenças crônicas, como obesidade, hipertensão arterial e diabetes mellitus [10].

Em relação aos aspectos legislativos pertinentes ao macarrão instantâneo, grande parte dos itens discutidos neste trabalho estão presentes no rótulos analisados, estando em conformidade com os órgãos que regem esta categoria de produto; com exceção da definição de porção, presente na RDC 360/03, em que estabelece idade mínima de 36 meses, porém observa-se que nos estudos citados, há o consumo de alimento regido por esta resolução por crianças abaixo desta faixa etária, sendo necessário reanalisar ou adequar a legislação ao público consumidor.

Conclusão:

Observa-se que o consumo de macarrão instantâneo pelo público infantil permite o suprimento parcial de carboidratos e proteínas, sendo o ideal a reposição restante oriundas de diversas fontes alimentares, sobretudo alimentos in natura por oferecerem melhor benefício a saúde; supre a quantidade total de vitaminas B, porém carece de outras vitaminas essenciais, como vitamina A e K, sendo necessário a sua ingestão, pois a carência de tais nutrientes podem acarretar a cegueira e a problemas de coagulação sanguínea [9,10].

É essencial a influência dos pais na educação alimentar dos seus filhos, visando minimizar problemas de neofobias alimentares (rejeição a determinados alimentos) a longo prazo [10]. 

Referências Bibliográficas: 

[1] BRASIL, RDC nº 93, de 31 de outubro de 2000. Dispõe sobre o regulamento técnico para fixação de identidade e qualidade de massa alimentícia. Acessado em: 01 de outubro de 2020;

[2] BRASIL, RDC nº 259, de 20 de setembro de 2002.  Dispõe sobre regulamento técnico de rotulagem de alimentos embalados. Acessado em: 20 de setembro de 2020;

[3] BRASIL, RDC nº 360, de 23 de dezembro de 2003. Dispõe sobre regulamento técnico de rotulagem nutricional de alimentos embalados. Acessado em: 21 de setembro de 2020;

[4] Codex Standard 1-1985. General Standard for the labelling of prepackaged foods. Acessado em: 20 de setembro de 2020;

[5] Codex Standard 249-2006. Standard for instant noodles. Acessado em: 20 de setembro de 2020;

[6] Institute of Medicine 2005. Dietary Reference Intakes for Energy, Carbohydrate, Fiber, Fat, Fatty Acids, Cholesterol, Protein, and Amino Acids. Washington, DC: The National Academies Press. Acessado em: 01 de outubro de 2020; 

[7] Institute of Medicine 2005. Dietary Reference Intakes for Water, Potassium, Sodium, Chloride, and Sulfate. Washington, DC: The National Academies Press. Acessado em: 01 de outubro de 2020; 

[8] Institute of Medicine 1998. Dietary Reference Intakes for Thiamin, Riboflavin, Niacin, Vitamin B6, Folate, Vitamin B12, Pantothenic Acid, Biotin, and Choline. Washington, DC: The National Academies Press.  Acessado em: 01 de outubro de 2020; 

[9] KARNOOP, E. V. N. et al. Food consumption of children younger than 6 years according to the degree of food processing. Jornal de pediatria, Brasil, v.93, n.1, p.70-78, 2017, acessado em: 01 de outubro de 2020;

[10] LIBANIO, I. F. D. F. et al. Consumo de alimentos ultraprocessados em crianças atentidas pelo serviço de atenção básica  na região sul do brasil. International Journal of Nutrology, Porto Alegre/BR, v.12, n.1, p.35-40, 2019, acessado em: 01 de outubro de 2020;

[11] OLIVEIRA, Í. R. D. A. et al. Tipo de alimentação consumida  entre crianças de 2 a 4 anos no estado do Acre, através do SISVAN web. DêCiência em foco, Brasil, v.3,n.1, p.25-38, 2019, acessado em: 01 de outubro de 2020;


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