Apresentação

Espaço para a apresentação e análise de estudos e pesquisas de alunos da UFRJ, resultantes da adoção do Método de Educação Tutorial, com o objetivo de difundir informações e orientações sobre Química, Toxicologia e Tecnologia de Alimentos.

O Blog também é parte das atividades do LabConsS - Laboratório de Vida Urbana, Consumo & Saúde, criado e operado pelo Grupo PET-SESu/Farmácia & Saúde Pública da UFRJ.Nesse contexto, quando se fala em Química e Tecnologia de Alimentos, se privilegia um olhar "Farmacêutico", um olhar "Sanitário", um olhar socialmente orientado e oriundo do universo do "Consumerismo e Saúde", em vez de apenas um reducionista Olhar Tecnológico.

terça-feira, 27 de outubro de 2020

Análise da quantidade de vitamina C nas balas Fini

 

Um pacote dessas balas realmente nos fornece 100% da Vitamina C diária, como ela próprio menciona em sua embalagem?

  1. Descrição

O produto selecionado para este trabalho está cada vez mais presente no dia a dia dos brasileiros nos dias de hoje. As balas são produtos que sempre chamaram atenção do consumidor de forma geral, sobretudo das crianças, seja pelo seu sabor doce ou até mesmo por serem bastante coloridas. Entretanto, com a crescente preocupação em relação a alimentação da população devido ao desenvolvimento de hábitos alimentares ruins nos últimos anos, causando assim diversos tipos de doenças associadas à má alimentação, como por exemplo hipertensão e obesidade (em crianças sobretudo), alimentos com baixos valores nutritivos e com muito teores de açúcar começaram a ser evitados e a sofrer uma forte propaganda contrária a seu consumo.

Pensando nisso, umas das principais marcas dentro deste ramo, a Fini, decidiu lançar uma nova linha de seus produtos denominada de Natural sweets, que seriam balas tradicionais porém agora com um valor nutritivo agregado. Entre os produtos dessa linha, se destaca o que apresenta Vitamina C, onde seu rótulo afirma que este produto contém 100% das necessidades diárias de vitamina C, sem maiores detalhes. Porém, este produto realmente fornece quantidades significativas de Vitamina C baseado nos valores de ingestão recomendável diária para este nutriente? Este trabalho tem o objetivo de analisar essa informação e buscar em referências se isso realmente é verdade ou apenas mais uma estratégia para aumentar as vendas.

               2. Fundamentos Bromatológicos

 A vitamina C ou ácido ascórbico (AA), é uma vitamina hidrossolúvel e termolábil que os seres humanos são incapazes de sintetizar. Ela participa dos processos celulares de oxirredução, sendo assim antioxidantes, como também é importante na biossíntese das catecolaminas. Previne o escorbuto, é importante na defesa do organismo contra infecções e mantém a integridade das paredes dos vasos sangüíneos. Além disso, é essencial para a formação das fibras colágenas existentes em quase todos os tecidos do corpo humano, tais como a derme, cartilagem e ossos. 

As vitaminas podem ser usadas na prevenção e tratamento de carências nutricionais e também na terapia de doenças não relacionadas  uma deficiência específica. Em situações de carência destes nutrientes, as vitaminas exercem atividade fisiológica, prevenindo e revertendo síndromes clínicas ocasionadas pela deficiência, que são denominadas como hipovitaminoses e são causadas sobretudo por conta de  carências nutricionais, podendo ser oriundo também de problemas na absorção intestinal, transporte plasmático, armazenamento tecidual, além de conversão à forma ativa e depuração.

Portanto, um produto que apresente níveis consideráveis de Vitamina C e que seja de fácil acesso e consumo pela população, seria então muito importante do ponto de vista bromatológico, uma vez que poderia aumentar o consumo dessa vitamina tão importante para todos, sobretudo por conta dessa facilidade de consumo e por se apresentar de uma forma bem atrativa para grande parte da população de forma geral. Entretanto, outros aspectos devem ser analisados pelo consumidor, como o teor de carboidratos presentes no produto ou se possui algum tipo de alergia a algum ingrediente utilizado no produto.  


3. Legislação

De acordo com o Anexo I da RDC 23/2000 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), produtos como balas, bombons e similares são alimentos dispensados da obrigatoriedade de registro. Ao analisar os dados fornecidos na embalagem do produto escolhido por mim, não se encontra nada relacionado a registros, o que é justificável de acordo com a RDC mencionada. 

Entretanto, no Anexo II desta mesma RDC, que aborda sobre produtos com registro obrigatório, encontram-se os alimentos com alegação de propriedades funcionais e ou de saúde. Além disso, segundo a ANVISA na RDC 18/99, alimentos de propriedade funcional seriam: aqueles relativos ao papel metabólico ou fisiológico que o nutriente ou não nutriente tem no crescimento, desenvolvimento, manutenção e outras funções normais do organismo humano.

Ao analisar este fato, a indicação do produto possuir Vitamina C na sua formulação poderia fazer o produto ser enquadrado nessa categoria. Entretanto, esta alegação é opcional por parte da empresa e assim, caso seja solicitada deverá ser comprovada e dificilmente se conseguiria comprovar se esse produto possui atividade funcional.

Além disso tudo, a RDC N° 18, de 30 de Abril de 1999 mencionada acima, ainda define em relação à rotulagem de alimentos funcionais que:

 

a) não se pode apresentar no rótulo atributos de efeitos ou propriedades que não possam ser demonstrados;

b) é proibida a indicação de que o alimento possui propriedades medicinais ou terapêuticas;


Por fim, a ANVISA também determina na mesma RDC que os nutrientes com funções reconhecidas pela comunidade científica não será necessária a demonstração de eficácia ou análise da mesma para alegação funcional na rotulagem. Isso poderia ser sim o caso desse produto, uma vez que a Vitamina C possui ações e efeitos vastamente discutidos e reconhecidos por toda a sociedade e comunidade científica.

Em relação ao CODEX alimentarius, foi proposto uma série de NRVs-R (Nutrient Reference Values - Requirements) para cobre, ferro, magnésio, fósforo e vitaminas na Comissão. Os NRVs-R são usados na rotulagem nutricional de alimentos. Eles se referem às doses diárias de referência para vitaminas e minerais para uma população adulta. De acordo com as Diretrizes do Codex sobre Rotulagem Nutricional, as quantidades de vitaminas e minerais presentes nos alimentos devem ser declaradas no rótulo dos alimentos pré-embalados. As informações numéricas sobre vitaminas e minerais devem ser expressas em unidades métricas e / ou como porcentagem do NRV. Isto foi observado para o produto escolhido.


4. Discussão

O rótulo do produto mencionado afirma que ele apresenta 45 mg de vitamina C, o que seria 100% do valor diário recomendado. Entretanto, não especifica para qual estágio da vida essa informação seria verdade, uma vez que os valores recomendados de determinado nutriente não são os mesmos para todas as pessoas. Sexo, idade, se é gestante ou não, ou até mesmo se é lactante, influencia no valor recomendado e máximo a ser ingerido.  

O rótulo do produto seria o seguinte:



    Assim, ao analisar a tabela nutricional de Dietary reference intakes, essa informação apenas seria verdade para meninos ou meninas de até 13 anos de idade, sendo essa informação falsa para as demais categorias mencionadas nesta tabela nutricional. Podemos inclusive pegar o meu caso como exemplo, onde sou um homem de 22 anos de idade, onde de acordo com a tabela nutricional de referência mencionada, o meu valor recomendado diário de vitamina C seria de cerca de 75 mg, ou seja, 30 mg a mais do que está teoricamente contido dentro deste produto.
    Portanto, ao colocarem como 100% de Valor Diário para Vitamina C em seu rótulo, o mencionado produto, apesar de não estar indo contra o que foi postulado pela legislação brasileira, acaba enganando seu consumidor de certa forma, pois a estratégia adotada aqui seria a de utilizar um dos menores valores recomendados de Vitamina C para um grupo de pessoas específicas, dando a entender que para a maior parte dos consumidores que irão consumir esse produto eles estariam consumindo 100% do que eles precisam dessa vitamina em um dia, quando isso não é verdade.

            5. Conclusão

Portanto, podemos concluir que este produto na realidade conta uma meia verdade. Ele possui sim 100% dos valores diários de vitamina C recomendado, porém apenas para uma pequena parcela da população. O que é dito no rótulo funciona muito mais como uma jogada de marketing para atrair mais consumidores, uma vez que passa a sensação de ser um alimento saudável. Além disso, seu rótulo possui pouquíssimas informações acerca de outros aspectos importantes.

Dessa forma, mais uma vez temos um produto cujo o seu rótulo nutricional mais confunde o cliente do que realmente informa. Como foi dito, não há nenhuma informação na embalagem que garanta ao consumidor que esta informação fornecida por eles de que “os valores contidos aqui de Vitamina C são 100% do necessário em um dia” seja realmente verdadeira, funcionando assim apenas como forma de propaganda. Infelizmente, é visto cada vez mais produtos preferem adotar uma forma de propaganda enganosa para atrair novos consumidores do que realmente informar e ajudar a população, o que seria extremamente útil sobretudo para este produto escolhido, uma vez que com certeza seria uma excelente forma de fornecer os valores  de Vitamina C de forma rápida e de fácil acesso para grande parte da população.


6. Referências 

  • Manela-Azulay, Mônica, et al. "Vitamina C." Anais brasileiros de dermatologia 78.3 (2003): 265-272.

  • Joint FAO/WHO Codex Alimentarius Commission. Codex Alimentarius : Cereals, Pulses, Legumes and Vegetable Proteins. Rome :World Health Organization : Food and Agriculture Organization of the United Nations, 2007.

  • Padovani, Renata Maria, et al. "Dietary reference intakes: aplicabilidade das tabelas em estudos nutricionais." Revista de Nutrição 19.6 (2006): 741-760. 

  • Fuchs FD, Wannmacher L. Farmacologia Clínica: Fundamentos da Terapêutica Racional. 4a ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2010.





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