Apresentação

Espaço para a apresentação e análise de estudos e pesquisas de alunos da UFRJ, resultantes da adoção do Método de Educação Tutorial, com o objetivo de difundir informações e orientações sobre Química, Toxicologia e Tecnologia de Alimentos.

O Blog também é parte das atividades do LabConsS - Laboratório de Vida Urbana, Consumo & Saúde, criado e operado pelo Grupo PET-SESu/Farmácia & Saúde Pública da UFRJ.Nesse contexto, quando se fala em Química e Tecnologia de Alimentos, se privilegia um olhar "Farmacêutico", um olhar "Sanitário", um olhar socialmente orientado e oriundo do universo do "Consumerismo e Saúde", em vez de apenas um reducionista Olhar Tecnológico.

domingo, 8 de junho de 2014

Sorvente de Baunilha sem Baunilha?



Por Tatiana Matos e Dayana Cabral

O sorvete é um produto que agrada aos mais variados paladares, de todas as faixas etárias e de qualquer classe social. São alimentos refrescantes que combinam muito bem com o clima tropical do país. Em específico, o sorvete de massa constitui hoje um dos gelados comestíveis mais populares. Diversos sabores surgiram ao longo dos anos, mas o clássico sorvete de baunilha sempre esteve presente nas mesas brasileiras, seja sozinho ou acompanhando de um bom petit gateau. Devido ao aumento no consumo, este produto vem sofrendo alterações, tanto de processamento, quanto em seus ingredientes, na busca por melhores rendimentos e qualidade. Mas, se a composição está sendo modificada e os ingredientes trocados, como eu posso saber se ainda tem baunilha nesse sorvete? 



 

Os sorvetes são alimentos que segundo a RDC 266/2005 podem ser enquadrados na categoria de gelados comestíveis, sendo obtidos a partir de uma emulsão de gorduras e proteínas; ou de uma mistura de água e açúcar(es), na qual podem ser adicionados outro(s) ingrediente(s) desde que não descaracterize(m) o produto. Basicamente, é uma sobremesa gelada à base de lacticínios, como leite ou nata, à qual são adicionadas frutas dentre outros ingredientes. A maior parte dos sorvetes contém açúcar, embora alguns possam ser feitos com adoçantes, como por exemplo, os sorvetes dietéticos. Em alguns casos, são acrescentados corantes ou aromatizantes como complemento ou em substituição dos ingredientes naturais, como acontece nos sorvetes de massa industrializados. Em relação ao seu valor calórico, isto dependerá da sua composição, ou seja, das matérias-primas utilizadas para sua fabricação.

Além de muito saborosos, os sorvetes podem contribuir como fonte de proteínas e carboidratos, desde que façam parte de uma dieta equilibrada, sem exageros. É bastante comum esse alimento ser utilizado em hospitais, especialmente por crianças submetidas à quimioterapia, as quais têm dificuldade de se alimentar. Além do valor nutritivo, por ser gelado, o sorvete é um ótimo analgésico e ajuda a evitar as náuseas causadas pelo tratamento nas crianças. Nas cirurgias na região da garganta, ele também costuma ser indicado. Do ponto de vista nutricional, o sorvete é também um excelente complemento alimentar e possui alto valor nutritivo. A razão para isso é que ele contém proteínas, açúcares, gordura com vitaminas A, B1, B2, B6, C, D, K, cálcio, fósforo e outros minerais essenciais numa nutrição balanceada. Por ter alto teor calórico e proteico, ele igualmente contribui na síntese de proteínas e ainda age como fonte de energia.

 Apesar de serem popularmente aceitos como o mesmo tipo de sorvete, existe ainda uma grande confusão acerca das diferenças entre sorvete de creme e sorvete de baunilha. Na realidade o sorvete de creme e o sorvete de baunilha possuem formulações diferentes:
O sorvete de creme é produzido com manteiga de leite  e aromatizantes (inclusive o de baunilha). Já o sorvete de baunilha, não possui a manteiga de leite, e leva extrato de baunilha em uma dose significativamente maior, possuindo, por essa razão, um sabor mais característico. Vale frisar que a essência de baunilha é artificial, obtida a partir da síntese química, com odor e sabor sintético, semelhante ao de balas. Já o extrato de baunilha foi obtido da fava de baunilha natural, que foi deixada em infusão em meio alcoólico, sendo dotada de sabor intenso e bastante aromática.
Devido a essa diferença em seu preparo, nota-se inclusive uma diferença visual entre os dois tipos de sorvetes. Comparativamente, o sorvete de creme costuma ser mais amarelo ou amarelado, enquanto o de baunilha costuma ser branco. No entanto, como a receita dos dois tipos de sorvete não é fixa, nem sempre se observa essa diferença de coloração, podendo um sorvete de creme ser branco, ou inclusive um sorvete de baunilha resultar amarelado.
Tendo em vista a crescente produção de sorvetes no Brasil e seu aumento de consumo nos últimos anos, iremos exemplificar as principais diferenças, assim como alertar sobre a qualidade dos produtos presentes atualmente no mercado. Este estudo decidiu analisar 3 sorvetes de marcas diferentes: sorvete artesanal  caseiro de baunilha, sorvete de baunilha (Vanilla)  Haagen Dazs e sorvete Kibon Momentos Vanilla – Linha Premium.
 1)  Sorvete artesanal caseiro de baunilha:


O Sorvete de Baunilha Caseiro, por ser uma produção artesanal, leva na sua composição apenas 5 ingredientes: Creme de Leite, Leite, Açúcar, Gema de Ovo e Baunilha Natural (fava de Baunilha).  A gema de ovo atua como um emulsificante natural, não sendo necessário a adição de espessantes ou ou adjuvantes sintéticos, nem qualquer corante.

2) Sorvete Haagen Dazs Importado sabor Baunilha:




Para o sorvete da Haagen Dazs, que é importado, é possível visualizar em sua lista de ingredientes, que a composição é basicamente a mesma do sorvete artesanal, diferindo apenas por usar o extrato de Baunilha na concentração de 1%. Também não apresenta corantes ou quaisquer adjuvantes.
3) Sorvete Kibon Momentos Baunilha:


 Para este sorvete, que diz ser uma linha “Premium”, ao visualizar sua lista de ingredientes, é possível imediatamente notar que sua “receita” apresenta muito mais que 5 componentes (ao todo são 26). E ainda, um olhar mais atento, permite constatar que não há presença de Baunilha, mas sim de aromatizantes artificiais. Ou seja, há somente a essência de baunilha sintética. Considerando que a RDC 259/2002 preconiza que a lista de ingredientes deve trazer seus componentes de forma decrescente na rotulagem, isto é, daquele presente em maior quantidade para aquele em menor, é possível concluir que pelo fato do aromatizante estar no final da lista, é um dos ingredientes com menor quantidade no produto. Para finalizar, ainda há 4 corantes (urucum, cúrcuma, caramelo II e Bordeaux) presentes nesta relação, além dos conservantes. Quanto mais aditivos, maior sua vida de prateleira, e consequentemente, seu prazo de validade.

Outro critério para auxiliar na avaliação da qualidade do sorvete é medir a quantidade de ar que o mesmo apresenta. O “overrun” ou aumento do volume pela incorporação de ar é uma das etapas mais importantes da fabricação de sorvetes, já que influencia diretamente na qualidade e rendimento da mistura. Todo sorvete de massa, apresenta ar. Porém, os de melhor qualidade, tem menos ar. Para esta análise, basta apenas pesar a massa ocupada por uma quantidade de sorvete em um recipiente de volume conhecido. Ao preenchê-lo de sorvete, pesa-se e compara-se as massas encontradas. Os sorvetes industrializados, atualmente são os que possuem maior quantidade de ar, quando comparados com os artesanais ou caseiros. Tal fato pode ser comprovado durante a observação em seu derretimento: é como se o sorvete “murchasse”, sendo possível identificar que há menos sorvete naquele produto que há maior quantidade de ar.
Ao analisar os valores de cada produto, tem-se o seguinte (média de preço):

Sorvete Artesanal: R$ 25,00 pote de 500 ml              
Sorvete Importado Haagen Dazs: R$ 24,90 pote de 473 ml
Sorvete Kibon Momentos – Linha Premium: R$ 15,90 pote de 460 ml


Discussão: 

Sorvetes mais populares costumam ser mais baratos em termos de preço, além de serem vendidos em maiores quantidades, causando a falsa ilusão que rendem mais. Porém apresentam maior teor de conservantes e aromatizantes que os sorvetes artesanais ou caseiros. Além disso, há uma alta concentração de aditivos e adjuvantes, que é uma técnica utilizada pela indústria para gerar o sabor desejado, reduzindo os custos. Antigamente, havia a Portaria nº 379, de 26 de abril de 1999, que delimitava as quantidades mínimas de frutos ou polpa de frutas que deveriam estar presentes nos gelados comestíveis. Todavia, esta Portaria foi revogada, sendo substituída pela RDC 266/2005, que não faz qualquer ponderação a respeito dessas quantias. Dessa forma, os sorvetes industriais são produzidos de modo artificial e sintético, não havendo a presença do fruto natural, no caso a fava da baunilha. Estes ingredientes sintéticos são desconhecidos pela maior parcela da população, bem como seu modo de obtenção e ademais são comumente causadores de reações alérgicas. Por exemplo, o corante Bordeaux é produzido através da tinta do alcatrão de carvão, já foi banido em diversos países em virtude da sua toxicidade comprovada em testes in vivo e deve ser evitado por pessoas alérgicas à aspirina. Outrossim, é crível o percentual de ar contido nos sorvetes industriais, possibilitando assim que o consumidor adquira um produto com menor quantidade (massa), iludido pelo volume presente no recipiente. Já os sorvetes que são produzidos de forma artesanal, com ingredientes naturais, sem adição de conservantes e corantes, são mais caros e rendem menos, fazendo com que o consumidor dê preferência aos industrializados pela quantidade.

Conclusão: 

Considerando a qualidade e a quantidade oferecidas pelos produtos disponíveis atualmente no mercado, assim como seu custo benefício, faz se importante uma análise crítica do consumidor no ato da compra, sobre qual sorvete ele deve adquirir para oferecer à sua família. Principalmente nos casos em que existem pessoas com dietas especiais ou que apresentam intolerância alimentar, haja vista que os mais populares não possuem ingredientes naturais, as legislações presentes no país são permissivas e os fabricantes trazem poucas informações a cerca das suas etapas de produção.



Referências Bibliográficas:
BRASIL, Ministério da Saúde. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução RDC n.2, de 07 de janeiro de 2002. Disponível em:
BRASIL, Ministério da Saúde. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução RDC n.266, de 22 de setembro de 2005. Disponível em:
BRASIL, Ministério da Saúde. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Portaria n.379, de 26 de abril de 1999 (revogada). Disponível em:
BRASIL. Resolução RDC n. 259 de 2002 – Regulamento Técnico para Rotulagem de Alimentos Embalados.
Dossiê Corantes. Food Ingredients Brasil nº 9, 2009.
SAÚDE, Revista Viva. DESFRUTE DO DELICIOSO SORVETE. 2013. Disponível em: <http://revistavivasaude.uol.com.br/nutricao/desfrute-do-delicioso-sorvete/542/>. Acesso em: 09 maio 2014.
SILVA K, BOLINI HMA, ANTUNES AJ. Soro de leite bovino em sorvete. Alim. Nutr., Araraquara, v. 15, n. 2, p. 187-196, 2004.
SOUZA J, et al. Sorvete: composição, processamento e viabilidade da adição de probiótico. Alim. Nutr., Araraquara, v.21, n.1, p. 155-165, 2010.

Um comentário:

  1. Esther Faria Braga - aluna oitavo período Farmácia UFRJ30 de outubro de 2014 às 23:13

    A leitura deste artigo colabora enormemente para que se possa exigir o consumo de produtos alimentícios sem que exista total lesão àquele que os compra. Restrições que impeçam esta rotulagem como o sorvete de baunilha que não apresenta absolutamente nenhum miligrama da mesma são ultrajantes, beneficiando somente os produtores enquanto os consumidores sofrem não somente pela ingesta de alimentos "falsos", visto que apenas contêm corantes e aromatizantes artificiais, como também graças às inúmeras reações adversas que tais substâncias podem provocar, entre elas alergias e outros distúrbios devido a sua possível toxicidade.

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