Apresentação

Espaço para a apresentação e análise de estudos e pesquisas de alunos da UFRJ, resultantes da adoção do Método de Educação Tutorial, com o objetivo de difundir informações e orientações sobre Química, Toxicologia e Tecnologia de Alimentos.

O Blog também é parte das atividades do LabConsS - Laboratório de Vida Urbana, Consumo & Saúde, criado e operado pelo Grupo PET-SESu/Farmácia & Saúde Pública da UFRJ.Nesse contexto, quando se fala em Química e Tecnologia de Alimentos, se privilegia um olhar "Farmacêutico", um olhar "Sanitário", um olhar socialmente orientado e oriundo do universo do "Consumerismo e Saúde", em vez de apenas um reducionista Olhar Tecnológico.

quinta-feira, 4 de agosto de 2016

Arsênio em cereais de arroz: Nossos bebês estariam em perigo?

Sabe-se que indivíduos contaminados com arsênico apresentam desordens que vão desde distúrbios gastrointestinais à câncer. O FDA desde 2011 monitora os níveis de arsênio em alimentos. Em 2016, FDA propôs um nível limite de 100ppb de arsênio inorgânico em alimentos a base de arroz em cereais infant formula. Porém, foram visto que empresas ainda apresentam um percentual maior que o limite. Será que nossos bebês estão protegidos? Quais são os riscos? Leia mais…



1.      INTRODUÇÃO

Os alimentos infant fórmula são definidos por lei como, em parte, um alimento para ser usado por crianças que simula leite humano ou é adequado como um substituto total ou parcial para o leite humano. Os alimentos infant formula são importantes durante os 4 aos 6 meses de idade que é o período de maior crescimento e desenvolvimento e a quantidade de nutrientes requeridos são maiores que durante a maior parte da vida do indivíduo. Em 1980 aconteceu a primeira Lei de Infant formulas, mas desde então aconteceram mudanças na sua composição.
Os cereais infant são muito utilizados por mães como forma de complementar a alimentação de seu filho durante a sua fase de crescimento. Alguns elementos químicos devem ser monitorados durante a produção dos cereais de arroz infantis, como o arsênio inorgânico. O arsênio (As) é um elemento químico que está presente no solo e água, sendo que o arsênio inorgânico, arsenito e arsenato, é o mais tóxico. Visto isso, desde 2011 o Food and Drug Administration (FDA) vem acompanhando os níveis de arsênio e depois de novos métodos para diferenciar as formas de arsénio tornou-se disponível, a agência expandiu seu teste para ajudar a melhor compreender e gerir eventuais riscos relacionados com o arsênio associados ao consumo de alimentos nos Estados Unidos.
Arroz é um alimento que possui os níveis mais elevados de arsênico inorgânico do que outros alimentos, em parte porque as plantas de arroz crescem, a planta e grãos tendem a absorver arsênico mais facilmente do que outras culturas alimentares.
Em abril de 2016, a FDA propôs um nível de ação, ou limite, de 100 partes por bilhão (ppb) de arsênico inorgânico no cereal de arroz infantil. Este nível, que é baseada na avaliação do FDA de um grande corpo de informações científicas, procura reduzir a exposição infantil ao arsênico inorgânico.
No Brasil, em 2013, aconteceu um incidente de ser encontrado níveis altíssimos de arsênio em arroz. A RDC nº 42 de 25 agosto de 2013 tornou-se vigente e estipula valor máximo limite do metal, arsênio, para os alimentos e os cereais a base de arroz devem possuir um limite máximo de 300ppb, não abrangindo alimentos para lactantes e crianças de primeira infância.
Os riscos da ingestão de arsênio inorgânico inclui a ocorrencia de câncer de pulmão e bexiga, por exemplo, além de problemas no trato gastrointestinal.

2.      FUNDAMENTOS BROMATOLÓGICOS

O arsênio é um metal da família 5A que está presente em água, solo e ar. Sendo que o mesmo se apresenta nas formas orgânica e inorgânica. O arsênio inorgânico, arsenito- As(III) e arsenato- As(V), é mais tóxico que o orgânico, cerca de 100 vezes, e a dose letal desse elemento para indivíduos adultos é cerca de 3-30mg/kg, no entanto. No momento da ingestão, estima-se que 50-70% do arsenato é absorvido e metabolizado à arsenito na corrente sanguínea através de uma enzima não enzimática com a glutationa. O arsenito é mais tóxico que o arsenato e essa etapa é chamada de biotransformação. No interior das células esse arsenito é metilado à ácido monometilarsênico (MMA) e ácido dimetilarsênico (DMA). As primeiras provas a serem eliminadas são as formas inorgânicas e após 8h são eliminas as formas metiladas. O tempo de meia vida do arsênio é de 10h e 50-80% é eliminado em até 3 dias e a meia vida biológica das formas metiladas é de 30 dias.
As ações biológicas do As estão intimamente ligadas às suas formas químicas e a seus estados de oxidação (sua especiação química) e a toxicidade também está relacionada as suas ações. A exposição aguda e crônica desse elemento pode ser associado a aparições de cânceres, doenças cardiovasculares, desordens neurológicas, entre outros. As patologias resultantes da contaminação humana pelo As advêm da produção endógena de espécies oxigenadas e nitrogenadas reativas (ROS e RNS, respectivamente). Uma vez absorvido, os compostos do arsênico sofrem biotransformações. No organismo, o arsênio não é capaz de se ligar às proteínas do plasma, sendo rapidamente removido do sangue e distribuído aos tecidos de forma ampla.
O estresse oxidativo produzido por esses radicais, especialmente os radicais OH e ONOO, produzidos durante a biotransformanção dos arsenicais, pode peroxidar lipídios, formar adutos e quebras nas moléculas de DNA e aberrações cromossômicas, o que acarreta desde alterações na pele até vários tipos de câncer.

3.      LEGISLAÇÃO

A legislação vigente no Brasil que dispõe sobre os limites máximos aceitáveis de contaminantes inorgânicos nos alimentos é a RDC nº 42, de 29 de agosto de 2013. Sendo essa a mesma utilizada pelo Mercosul.
A legislação vigente não se aplica aos alimentos para lactantes e crianças de primeira infância. Porém, há uma Consulta Pública nº 209, de 20 de junho de 2016, que dispõe sobre Estabelece os limites máximos tolerados (LMT) dos contaminantes arsênio inorgânico, cádmio total, chumbo total e estanho inorgânico em alimentos infantis. Nessa consulta pública está estabelecido que o limite máximo tolerado para alimentos à base de cereais para alimentação infantil será de 0.10mg/Kg que corresponde à 100ppb. Contudo, essa Consulta Pública está em proposta recebendo sugestões para estabelecer o limite toxicológico de alguns contaminantes sendo um deles o arsênio. O FDA em abril de 2016 propôs um limite de 100ppb para cereais a base de arroz.
Portanto, os níveis de limite máximo tolerado da ANVISA pode-se observar que segue os mesmos valores que o FDA estipulou meses antes.

4.      DISCUSSÃO

O arsênio é um elemento químico que está presente nos organismos vivos apresentando ações essenciais no organismo, porém é sabido que o mesmo apresenta efeito carcinogênico para humanos segundo a Agência Internacional de Pesquisa sobre Câncer.  Sabe-se que o arsenato é biotransformado à arsenito no organismo e esse tem a capacidade de reagir com grupamentos tiol de resíduos de cisteína formando uma estrutura estável, o que acarreta uma inativação de proteínas e enzimas, além de interferir na replicação e reparo do DNA.
O arsênio é encontrado no solo, ar e alimentos. Em 2013, foram encontrados níveis elevados de As nas amostras de solo (50-1000mg/g) coletados no Quadrilátero Ferrífero de Minas Gerais. Esse valor é muito superior ao limite recentemente indicado pelo Codex Alimentarius que o valor máximo permitido seria de 0.3mg/Kg para arsênio total ou arsênio inorgânico e é o mesmo limite máximo que preconiza a RDC nº 42, de 29 de agosto de 2013 para alimentos como cereais a base de arroz para adultos, que é o mesmo nível utilizado pelo Mercosul. No Brasil, foram feitas coletas de amostras de arroz e os níveis de arsênio se mantiveram superiores ao determinado pelo Codex Alimentarius e as formas inorgânicas e DMA foram as  espécies mais abundantes. Outros estudos utilizando amostras de alimentos infantis como biscoitos, cereais à base de arroz, entre outros, a concentração de As inorgânico encontrada foi significativamente maior que nos cereais à base de trigo, expondo principalmente crianças celíacas a altos riscos. Além disso, quando a ingestão de As por crianças entre 8 e 12 meses foi calculada, mostrou-se elevada. Algo interessante a ser pautato é que o FDA em abril desse ano, 2016, delimitou um novo limite para 100ppb visto que foram encontrados produtos no mercado que apresentavam um limite superior a 100ppb e isso geraria prejuízos às crianças de 8-12 meses que apresentam um sistema hepático pouco desenvolvivo para a metabolização do arsênio e geraria uma toxicidade mais eminente que em adultos. Visto isso, sabendo dos riscos que o elevado nível de arsênio poderia causar em crianças e ainda, que na atual legislação não possuia nenhuma resolução ou decreto que norteasse os níveis máximo que esses alimentos poderiam conter, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) em junho desse ano, 2016, pouco tempo depois do FDA, propôs uma Consulta Pública de número 209, de 20 de junho de 2016, que dispõe sobre Estabelece os limites máximos tolerados (LMT) dos contaminantes arsênio inorgânico, cádmio total, chumbo total e estanho inorgânico em alimentos infantis. Essa Consulta Pública ainda recebe sugestões de limites, porém, nesse documento aberto está descrito que o limite máximo para cereais a base de arroz é de 100ppb que foi o estipulado pelo FDA. Assim, visto os ocorridos no Brasil e os riscos evidentes que o arsênio pode proporcionar nos indivíduos, principalmente nas crianças, deve-se monitorar os níveis desses alimentos mais fortemente.


5.      CONCLUSÃO

O arsênio causa muitos danos ao indivíduos e principalmente em crianças que pode gerar problemas neurológicos até mesmo a morte devido a alta toxicidade que o arsênio pode causar. Assim, até pouco tempo os alimentos infantis não apresentavam respaldo da legislação quanto aos níveis máximos que seriam permitidos desse elemento. Os produtos alimentares adultos apresentam um limite superior máximo estipulado de 0.3mg/Kg, mesmo utilizado para o Mercosul, e a absorção e metabolização desse elemento depende de fatores como idade e ainda fatores inerentes ao consumidor. Após um ocorrido nos Estados Unidos da América, o FDA determinou um novo limite para produtos infantis a base de cereais de arroz vista a contaminação maior que os demais produtos e a ANVISA ainda está implementando uma nova resolução para determinar os limites máximos para esses alimentos. Assim, ainda sem a implementação de uma legislação que respalde o consumidor no consumo desses alimentos infantis a base de arroz sem perigos eminentes, os nossos bebês não estariam totalmente protegidos dos riscos que o arsênio pode causar.

 REFERÊNCIAS

Juliana Monteiro Bastos da Silva et. al. Arsênico - saúde: uma relação que exige vigilância. Vigilância Sanitária em Debate 2014; 2(1): 57-63.
Juliana M. O. Souza; Maria F. H. Carneiro et. al. Arsênio e arroz: toxicidade, metabolismo e segurança alimentar. Quim. Nova, Vol. XY, No. 00, 1-10, 200_.
Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Resolução de Diretoria colegiada nº 42, de 29 de agosto de 2013. Dispõe sobre Estabelece os limites máximos tolerados (LMT) dos contaminantes arsênio inorgânico, cádmio total, chumbo total e estanho inorgânico em alimentos infantis.
Disponível em: <http://www.fda.gov/Food/FoodborneIllnessContaminants/Metals/ucm319870.htm> Acesso em: 03/08/2016
Disponível em: <https://www.federalregister.gov/articles/2016/04/06/2016-07840/inorganic-arsenic-in-rice-cereals-for-infants-action-level-draft-guidance-for-industry-supporting> Acesso em: 03/08/2016.
Disponível em: <http://www.fda.gov/ohrms/dockets/ac/02/briefing/3852b1_01.htm> Acesso em: 03/08/2016.
Disponível em: <http://portal.anvisa.gov.br/consultas-publicas#/visualizar/315604> Acesso em: 03/08/2016.
Disponível em: <http://www.brasil.gov.br/saude/2016/06/anvisa-abre-consulta-sobre-limite-toxicologico-em-comida> Acesso em: 03/08/2016.
Disponível em: <http://portal.anvisa.gov.br/documents/10181/2862128/(1)CP+209-2016+-+Proposta+de+norma+em+discuss%C3%A3o.pdf/fbb4af9d-c374-4595-8d6e-097c11d870e1> Acesso em: 03/08/2016. 

3 comentários:

  1. O arsênio ocorre naturalmente na água, solo e rochas, mas seus níveis podem ser mais altos em algumas áreas do que outros. Ele entra facilmente na cadeia alimentar e pode acumular-se em quantidades significativas em animais e plantas, algumas das quais são consumidas por seres humanos. Como resultado das atividades humanas, a poluição por arsênio tem aumentado.
    As principais fontes de poluição por arsênio incluem certos pesticidas e herbicidas, conservantes de madeira, fertilizantes fosfatados, resíduos industriais, atividades de mineração, queima de carvão e fundição. O arsênio frequentemente drena para as águas subterrâneas, que são fortemente poluídas em certas partes do mundo. Das águas subterrâneas, o arsênio encontra seu caminho em poços e outros suprimentos de água que podem ser usados para irrigação e cozimento de culturas. O arroz é particularmente suscetível à contaminação por arsênio, por três razões:

    1) É cultivada em campos alagados (arrozais) que requerem grandes quantidades de água de irrigação. Em muitas áreas, esta água de irrigação está contaminada com arsênio.

    2) O arsênio pode se acumular no solo dos arrozais, agravando o problema.

    3) O arroz absorve mais arsênio da água e do solo em comparação com outras culturas alimentares comuns.

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  2. Após ler a pesquisa, devo dizer que achei de extrema importância para o público ganhar conhecimento nessa área. Os alimentos infantis devem ser analisados cuidadosamente, entre tantas outras coisas, é uma fase intensa de desenvolvimento. É de conhecimento geral que arsênio pode ser danoso à saúde, mas saber que ele está tão próximo em produtos infantis é preocupante e acredito que nem todos possuem essa percepção. É um alivio saber que a legislação foi alterada. Atualmente a RDC Nº193/2017 é a que está em vigor. Nela determina o LMT como 0,15 mg/Kg, o que equivale a 150ppb, enquanto a FDA ainda mantém os 100ppb. Teria sido mais interessante se a RDC Nº193/2017 tivesse se mantido nos 0,10mg/kg para alimentos à base de cereais como constava na consulta, mas mesmo assim já é um avanço. Nessa RDC há os valores limites para alguns produtos infantis, o que garante mais seguridade para a população, já que esse componente é altamente tóxico.
    Parabéns pela pesquisa! Foi esclarecedora.

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  3. O arsênio (As) é um elemento tóxico classificado como pertencente ao grupo 1A de carcinogenicidade pela Agência Internacional de Pesquisa do Câncer (IARC). A exposição a este metaloide pode levar a vários riscos à saúde, especialmente muitos tipos de câncer como de pulmão, rim, pele e bexiga. As principais fontes de exposição ao As são por meio da ingestão de água e alimentos contaminados. O arroz (Oryza sativa L.) é um dos alimentos que pode conter contaminação por altas concentrações de As, uma vez que possui maior capacidade de absorver este elemento e por sua forma de cultivo ser realizada, na grande maioria, em solos alagados com condições anaeróbicas. Neste trabalho, o As total (tAs) foi quantificado por espectrometria de massas com plasma indutivamente acoplado (ICP-MS) nos principais tipos e marcas de arroz (n=103) e cereais infantis (n=27) comercializados e consumidos pela população brasileira. As concentrações de tAs encontradas nas amostras de arroz foram comparadas com os limites máximos de As permitidos por agências regulatórias, bem como as concentrações obtidas em outros estudos. Adicionalmente, foi avaliada a estimativa de ingestão diária de As do arroz consumido.


    FONTE:
    https://lume.ufrgs.br/handle/10183/188744#:~:text=A%20exposição%20a%20este%20metaloide,arroz%20(Oryza%20sativa%20L.)

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