Apresentação

Espaço para a apresentação e análise de estudos e pesquisas de alunos da UFRJ, resultantes da adoção do Método de Educação Tutorial, com o objetivo de difundir informações e orientações sobre Química, Toxicologia e Tecnologia de Alimentos.

O Blog também é parte das atividades do LabConsS - Laboratório de Vida Urbana, Consumo & Saúde, criado e operado pelo Grupo PET-SESu/Farmácia & Saúde Pública da UFRJ.Nesse contexto, quando se fala em Química e Tecnologia de Alimentos, se privilegia um olhar "Farmacêutico", um olhar "Sanitário", um olhar socialmente orientado e oriundo do universo do "Consumerismo e Saúde", em vez de apenas um reducionista Olhar Tecnológico.

terça-feira, 31 de maio de 2011

Molico Total Cálcio: A ingestão cada vez mais acentuada de cálcio é realmente benéfica para a saúde?




Produtos alimentares com acréscimo de cálcio são cada vez mais comuns nas prateleiras dos mercados. Em que tipo de dados epidemiológicos este tipo de oferta se baseia? Será que no Brasil há mesmo deficiência na ingestão deste nutriente na população como um todo? Pode ser que seu consumo indiscriminado traga riscos para a saúde?
Estudos recentes falam sobre os perigos de se consumir cálcio em excesso e sobre seus reais benefícios.


Molico Total Cálcio


O Cálcio é um elemento mineral encontrado em uma grande variedade de alimentos como os laticínios (leite e derivados), as hortaliças da espécie Brassicaoleracea (couves), verduras verde escuras, gergelim, amêndoas, feijões, entre outros. Sua absorção se dá a nível intestinal, e é favorecida por vitamina D, proteínas, lactose e a própria acidez do bolo fecal. No organismo o cálcio possui diversas funções como a formação da massa óssea, contração muscular, transmissão dos impulsos nervosos, e também ajuda na coagulação do sangue.

A nova linha da Nestlé, MolicoToltal Cálcio, promete com duas porções suprir 100% das necessidades diárias de cálcio, essas porções somadas fornecem um total de 1000 mg de cálcio. E a partir desta afirmação coube a nós avaliar alguns aspectos da apresentação do produto e seu consumo.


Legislação


A Resolução - RDC nº 259, de 2002 aprova o Regulamento Técnico para Rotulagem de Alimentos Embalados. Ela também estabelece que os alimentos embalados não devem ser descritos ou apresentar rótulo que: utilize vocábulos, sinais, denominações, símbolos, emblemas, ilustrações ou outras representações gráficas que possam tornar a informação falsa, incorreta, insuficiente, ou que possa induzir o consumidor a equívoco, erro, confusão ou engano, em relação à verdadeira natureza, composição, procedência, tipo, qualidade, quantidade, validade, rendimento ou forma de uso do alimento.

A Resolução - RDC Nº 269, de 2005 aprova o Regulamento Técnico sobre a Ingestão Diária Recomendada (IDR) de Proteínas, Vitaminas e Minerais. Segundo a RDC, a recomendação diária para a ingestão de cálcio é de 1000 mg/dia para adultos, 1200 mg/dia para gestantes e de 300 a 700 mg/dia para crianças de 0 a 10 anos.


Fundamentos Bromatológicos e Discussão



Baseado na legislação vigente no Brasil (ex.: Resolução 269 de 2005) podemos concluir que as recomendações de cálcio são diferentes para cada indivíduo. Então, dependendo da idade e das condições de um indivíduo, ele irá necessitar de uma dieta com mais ou menos cálcio, portanto um produto não pode afirmar suprir a necessidade de cálcio de todo e qualquer organismo, já que suas recomendações são diferentes.

Outro ponto a ser comentado é que o intestino absorve apenas cerca de 500 mg de cálcio por vez, com isso se o consumidor ingerir duas porções do produto simultaneamente, totalizando as 1000 mg deste íon, a absorção não será efetiva.

É importante notar também que a mídia que é feita em torno do produto transmite a idéia de que este tipo de suplemento alimentar é necessário na população como um todo. No entanto, não existem registros epidemiológicos nutricionais indicando a carência deste nutriente no público alvo, ou qualquer dado que justifique sua ingestão.

Se com apenas duas porções do produto em questão o indivíduo, teoricamente, alcança as recomendações de ingestão diária de cálcio, então o que fazer com o cálcio naturalmente presente na alimentação do brasileiro?

O próprio site da Nestlé que anuncia a linha Molico Total Cácio indica que uma fatia de 30g de queijo minas fornece 17% do cálcio diário. Uma de mussarela, 15%. Uma colher de requeijão (20g), 5%. Um copo de leite desnatado (200ml), 27%. Um de leite integral, 25%. Um de iogurte natural, 29%.

Assim, A mídia que envolve o produto não leva em consideração o cálcio naturalmente proveniente da dieta e que, na realidade, é capaz de fornecer o montante necessário deste nutriente sem que seja necessária a suplementação.

É valido acrescentar que um copo de leite de 200 ml fornece 240 mg de cálcio em média, um copo de iogurte natural contém 290mg; de coalhada, até 400 mg e uma fatia de queijo ( de 40 a 50 gramas) oferece de 230 a 250 mg de cálcio. Brócolis, couve e sardinha também são exemplos de boas fontes do mesmo.

O limite máximo de ingestão de cálcio por dia é de 2.500 mg. Embora seja difícil atingir e ultrapassar esse patamar só com alimentos, cálcio demais pode causar inconvenientes como diarréia e sobrecarga sobre os rins.

Além disso, estudos têm demonstrado que pessoas que usam suplementos de cálcio (sem a co – administração de vitamina D) têm risco 30% maior de sofrer infarto do miocárdio. Embora a magnitude do aumento no risco seja pequena, o uso disseminado de suplementos de cálcio, principalmente por idosos, com risco aumentado de fraturas ósseas, pode significar um grande impacto no número de eventos cardiovasculares na população geral.

O motivo pelo qual o cálcio aumenta o risco ainda não é conhecido, mas sugere-se que a suplementação de cálcio eleve os níveis séricos deste elemento, o que já foi previamente associado à maior incidência de infarto agudo do miocárdio.

Outra hipótese é que o processo de calcificação vascular, fator de risco estabelecido para doenças cardiovasculares, é semelhante ao processo da osteogênese (formação dos ossos). Sendo assim, já que os suplementos de cálcio aumentam a densidade óssea, é possível que eles também acelerem a calcificação vascular e conseqüentemente elevem a incidência de eventos cardiovasculares.

Outros trabalhos apontam também para o fato de que mulheres com osteoporose que usam suplementos de cálcio podem ter uma maior chance de sofrer fraturas no quadril. O alto consumo de cálcio pode reduzir o alargamento de alguns ossos, que geralmente ocorre para compensar a perda de densidade mineral do osso ocasionada pela idade. Além do que, altos níveis de cálcio diminuem o número de sítios ativos de remodelação óssea, diminuindo sua eficácia.

As mesmas pesquisas deixam claro que a ingestão de cálcio para valores acima do recomendado para cada indivíduo não reduz o risco de ocorrência de osteoporose, mas sim pode acarretar outras divergências para a saúde.

Conclusão

Diante dos fatos citados neste trabalho podemos concluir que a ingestão de alimentos com adição de cálcio não deve ser feita por todo e qualquer indivíduo independente de sua condição. A sua suplementação pode sim ser necessária, mas a fim de evitar outros problemas devido à ingestão não fundamentada deste nutriente, uma análise do estado de saúde da pessoa e dos níveis diários do mineral presente na sua alimentação normal deve ser feita. Assim uma consulta ao médico ou nutricionista, não só é bem vinda, como é necessária antes do consumo freqüente deste tipo de alimento.

Anexos
Imagens do produto:







Adaptação da Tabela de Ingestão Diária Recomendada para Adultos (RDC 269):



Adaptação da Tabela de Ingestão Diária Recomendada para Lactentes e Crianças (RDC 269):



Bibliografia Anexos


http://www.anvisa.gov.br/legis/resol/2002/259_02rdc.htm

http://www.crd.defesacivil.rj.gov.br/documentos/IDR.pdf

• Felippe, J Jr. : Pronto Socorro: Fisiopatologia – Diagnóstico – Tratamento. In Capítulo 10, José de Felippe Junior : Distúrbios Hidroeletrolíticos : Na+ , K+ , Ca++ , PO4 e Mg++ ; pag.82-97, 1990 ; Editora Guanabara Koogan, 2 a Ed. – Rio de Janeiro.

• Bashour, T.; Basha, H.S. & Cheng, T.O.: Hypocalcemic cardiomyopathy, Chest, 78(4): 663,1980.

• Bell, N.H.: Hypercalcemic and hypocalcemic disorders: Diagnosis and treatment. Nephron, 23:147,1979.

Dietary Supplement Fact Sheet: Calcium

http://www.bmj.com/content/342/bmj.d1473.full - BMJ 2011; 342:d1473

• British Medical Journal de 29 de julho de 2010 - (http://www.bmj.com/content/341/bmj.c3691.full) - http://www.news.med.br/p/medical-journal/63372/suplementos+de+calcio+podem+aumenta.htm

AUTORES: Karla Andrade Quintã e Larissa Jardim Ramalho

6 comentários:

  1. A mesma dieta que fornece cálcio naturalmente também possui outros minerais e fibras que reduzem a absorção de cálcio, ácido fítico, oxálico (presente em vegetais verdes- escuros) também reduzem a absorção por formação de sais insolúveis, aliás chocolate e morango (que crianças adoram) contém bastante oxalato de cálcio, alimentos contendo ferro e zinco reduz a eficácia do aproveitamento de cálcio, a cafeína e proteína também reduzem a absorção, esta última por acidificar a urina, o que faz deslocar sódio para a urina que carrega quantidades razoáveis de cálcio junto (tenta neutralizar), assim como o uso concomitante de certos medicamentos, como antiácidos, bloqueadores de secreção ácida, colestiramina e tetraciclina, reduzem a absorção por diminuição da solubilidade do cálcio, pela alteração do pH. Pessoas com deficiência na enzima lactase precisam de suplemento de cálcio, tomar grande quantidade de leite não vai ajudar, pois sem a enzima não há como liberar o cálcio da lactose. (Aspectos da absorção no metabolismo do cálcio e vitamina D- Vera Sônia Grüdtner1, Pedro Weingrill2 e Antonio Luiz Fernandes2 )
    Estudos epidemiológicos observaram que a ingestão de cálcio (próxima a recomendada diariamente) diminui o IMC, pois o cálcio altera o metabolismo dos adipócitos e a absorção de gordura pelo organismo. A baixa ingestão de cálcio leva ao aumento dos níveis sanguíneos que por sua vez agem nas células do tecido adiposo e aumenta a concentração de cálcio no seu interior, ativando enzimas relacionadas a lipogênese e também fatores inibidores de lipólise, ou seja, baixas concentrações de cálcio estão relacionadas ao acúmulo de ácidos graxos. Estudos feitos com 32 obesos, pacientes mantidos por 24 semanas em dietas deficitárias (500Kcal/dia) e paralelamente uma dieta rica em cálcio (800mg/dia de suplementação), uma dieta elevada de laticínios (1200mg a 1300mg de cálcio/dia suplementado com placebo) e uma dieta padrão (400 a 500mg de cálcio na dieta/dia suplementada por placebo). Os pacientes submetidos à dieta padrão perderam 2,5% do seu peso corporal, 26% na dieta rica em cálcio e 70% na dieta elevada de laticínios, a perda de gordura tanto na dieta rica em cálcio quanto na dieta elevada de laticínios. (Zemel e colaboradores, 2004).

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  2. Será que a criança que realmente precisa de uma dieta com suplementação de cálcio teria acesso a esse produto? Provavelmente, não.
    A pessoa que consumirá esse leite enriquecido não deve precisar de cálcio extra na sua alimentação. Mas, por causa do marketing, passa a acreditar que necessita.

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  3. A venda destes produtos Leite,iogurte e outros que são fontes fartas de Cálcio não é controlada,obviamente. E os consumidores em geral,independente do nível,na maioria das vezes,trazem o pensamento de que quanto mais nutrientes ele consumir melhor. É muito raro se pensar que excesso de Cálcio,"algo bom para minha saúde" vai me fazer mal,por exemplo pode me causar formação de pedras nos rins.Muito pelo contrário, pensa-se muito nos problemas que podem ocorrer pela deficiência do nutriente e então devido ao marketing para incentivar e a vontade de prevenir qualquer problema relacionado a carência os consumidores abusam destes produtos.

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  4. Como citado pela Roselane Cruz, o consumo excessivo de cálcio pode ocasionar a formação do cálculo renal (pedras nos rins), que é mais comum com a ingestão de cálcio de origem mineral, uma vez que a absorção deste tipo de cálcio não é muito bem feita pelo organismo, e também pode ocasionar a redução de outros minerais, como magnésio. O magnésio é um mineral essencial para o bom funcionamento do organismo humano. Existem mais de 300 enzimas diferentes, distribuídas pelo organismo, que são ativadas pelo magnésio o que evidencia a sua importância no metabolismo humano. O magnésio é essencial ao metabolismo da glicose, à produção de energia celular, à síntese de proteínas e do DNA. Ele atua principalmente nos processos de relaxamento e contração muscular. A deficiência de magnésio pode causar uma série de complicações com sintomas, como cãibra, fadiga, síndrome pré-menstrual, irritabilidade, insônia, perda de memória, entre outros.

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  5. O cálcio é um mineral importante para a saúde dos ossos e dentes. Além de auxiliar o funcionamento de músculos e nervos. Por isso, devemos ingerir alimentos fonte do mineral diariamente. Colocar no mercado um produto que supre as “necessidades” diárias de cálcio proporciona uma certa comodidade e o problema está na falta de conscientização das pessoas, que só pensam nos benefícios da ingestão do cálcio e não percebem que o excesso também leva a problemas de saúde. Muitas vezes as pessoas acham que somente o consumo daquele produto é necessário para tal e esquece que em uma alimentação equilibrada teria alimentos fonte de cálcio, mas também fonte de outros nutrientes importantes ao bom funcionamento do organismo.

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  6. A primeira pergunta que me veio á cabeça é a classificação deste alimento: é um suplemento vitamínico e mineral ou um alimento enriquecido? Segundo a portaria nº 32/98, suplementos vitamínicos e ou de minerais “são alimentos que servem para complementar com estes nutrientes a dieta diária de uma pessoa saudável, em casos onde sua ingestão, a partir da alimentação, seja insuficiente ou quando a dieta requerer suplementação. Devem conter um mínimo de 25% e no máximo até 100% da Ingestão Diária Recomendada (IDR) de vitaminas e ou minerais, na porção diária indicada pelo fabricante, não podendo substituir os alimentos, nem serem considerados como dieta exclusiva”. Classificam-se como suplementos as vitaminas isoladas ou associadas entre si, os minerais isolados ou associados entre si, as associações de vitaminas com minerais e os produtos fontes naturais de vitaminas e ou minerais. Já alimento enriquecido, segundo a portaria nº 31/98 é “todo alimento ao qual for adicionado um ou mais nutrientes essenciais contidos naturalmente ou não no alimento, com o objetivo de reforçar o seu valor nutritivo e ou prevenir ou corrigir deficiência(s) demonstrada(s) em um ou mais nutrientes, na alimentação da população ou em grupos específicos da mesma”. Dessa forma, a linha de produtos Molico Total Cálcio deve ser classificada como alimentos enriquecidos e, como tal, devem atender à portaria nº 31/98. O que me chamou a atenção no rótulo contido no anexo acima é que só encontramos o dizer: “Rico em vitamina D”. E o cálcio? Não deveria conter o mesmo dizer, segundo a legislação vigente? Ou basta dizer que é total cálcio ou 100% cálcio? Obviamente essa é uma estratégia de marketing para influenciar o consumidor a utilizar esses produtos como única fonte deste mineral, já que ele anuncia suprir 100% das necessidades diárias de cálcio. Só esquecem de mencionar que o excesso de cálcio (pois não podemos esquecer que outros alimentos consumidos normalmente na nossa alimentação também contem cálcio) pode trazer grandes malefícios, como já citado anteriormente.

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