Apresentação

Espaço para a apresentação e análise de estudos e pesquisas de alunos da UFRJ, resultantes da adoção do Método de Educação Tutorial, com o objetivo de difundir informações e orientações sobre Química, Toxicologia e Tecnologia de Alimentos.

O Blog também é parte das atividades do LabConsS - Laboratório de Vida Urbana, Consumo & Saúde, criado e operado pelo Grupo PET-SESu/Farmácia & Saúde Pública da UFRJ.Nesse contexto, quando se fala em Química e Tecnologia de Alimentos, se privilegia um olhar "Farmacêutico", um olhar "Sanitário", um olhar socialmente orientado e oriundo do universo do "Consumerismo e Saúde", em vez de apenas um reducionista Olhar Tecnológico.

terça-feira, 31 de maio de 2011

Cytopropolis Pharmanectar: Efeito Antitumoral?


Atualmente, uma das doenças de maior incidência é o câncer. E na tentativa de combater ou prevenir tal doença, empresas lançam mão de estratégias mercadológicas na tentativa de convencer o consumidor a comprar seus produtos, ditos detentores de propriedades antitumorais.
Alimentos ou parte de alimentos que garantem benefícios médicos e de saúde, incluindo a prevenção e/ou tratamento da doença, são chamados nutracêuticos. Tais produtos podem abranger desde nutrientes isolados, suplementos dietéticos na forma de cápsulas e dietas, até os produtos beneficamente projetados, produtos herbais e alimentos processados, tais como cereais, sopas e bebidas. (KWAK & JUKES, 2001a; ROBERFROID, 2002; HUNGENHOLTZ, 2002; ANDLAUER & FÜRST, 2002).

Proveniente da combinação de dois extratos da resina da planta Baccharis dracunculifolia, conhecida como Alecrim do Campo, o Cytopropolis Pharmanectar é mais um desses nutracêuticos comercializados que tentam cumprir suas promessas - destacando-se aqui sua propriedade antitumoral. Segundo o fabricante, ele garante propriedades citotóxicas e hematoestimulantes. Será que esse produto é uma biochance, como elucida o rótulo?

O Própolis verde é uma resina que as abelhas coletam nos brotos do Alecrim do Campo (Baccharis dracunculifolia) para proteger a colméia de bactérias e diversas doenças. Dessa resina verde, são elaborados 2 tipos de extratos: um com frações solúveis em água e outro com frações solúveis em álcool. Cytopropolis Pharmanectar® é a combinação balanceada e concentrada das duas frações do Própolis Verde - a aquosa e a alcoólica - onde temos 50% de ativos. O produto final chega ao consumidor após várias pesquisas e testes envolvendo alta biotecnologia.

A fração aquosa da própolis do Baccharis dracunculifolia é rica em ácido 2-cafeoilquinico (CAPE) e seus derivados, que possuem uma forte ação antioxidante e sequestrante de radicais livres. Tem também ação protetora hepática e das células pancreáticas. Além disso, em concentrações maiores tem ação citotóxica e anticitopênica, acelerando o tempo de redução dos tumores, principalmente pela ação da substância Artepillin C® - presente em maior concentração na composição do produto.



Também foi verificado um aumento da eficácia do método de radioterapia quando cobaias eram submetidas ao pré-tratamento com própolis, além de ser observado uma menor ocorrência de efeitos adversos em conjunto à estimulação das células sanguíneas.

Nutracêutico é um termo que vem sendo usado para um conjunto de substâncias que se situam entre comida e remédio, entre nutriente e medicamento, compreendendo não apenas nutrientes tradicionais, como vitaminas, sais minerais e aminoácidos, mas também não-nutrientes como as fibras, além de um grande arsenal de substâncias que parecem contribuir para a prevenção ou mesmo cura de doenças. Então, muitas vezes, por isso denominados alimentos funcionais - sendo que os mecanismos de ação não estão, na maioria dos casos, plenamente conhecidos, baseando-se as afirmativas mais em dados epidemiológicos do que em ensaios bioquímicos ou fisiológicos. Talvez por essa razão não haja uma legislação exigente como deveria existir para evitar o consumo irracional desses produtos. As informações são poucas. O termo é usado há pouco tempo. Muita gente não sabe o que é nutracêutico, propriamente disso.

O problema é que esse extenso conceito até pode atender a uma preliminar curiosidade dos consumidores, mas não sustenta, nem orienta, as medidas que devem ser tomadas pelos profissionais envolvidos com a questão, que devem, pelo menos, regulamentar a fabricação, a rotulagem e a propaganda destes produtos. No Cytopropolis Pharmanectar®, o único meio do consumidor entrar em contato, por ora mais íntimo com o produto, é através do site do fabricante. Solicitamos o rótulo e informações adicionais aos farmacêuticos da Empresa e só nos foi enviado o prospecto de venda do produto (vendido em mais de 20 países) e dois artigos científicos que não fundamentam os efeitos prometidos das substâncias. Quer dizer, qual o papel das agências reguladoras desses países? Quais suas posturas? Há um vazio regulamentador, quando se fala em nutracêuticos.

O Cytopropolis Pharmanectar®, é apresentado como nutracêutico antitumoral, antibiótico, anti-inflamatório e antimicótico, ou seja, a cura de todos os seus males. Será que é bem assim?

A utilização de própolis para o combate ao câncer foi testada em diversas oportunidades ao longo do tempo, (Scheller et al., 1989; Kimoto et al., 1996, 1998; Chen et al., 2003; Akao et al., 2003), nesses estudos identificou-se que o Artepillin C® é uma das substancias responsáveis pela atividade antitumoral dos extratos. Com base nas informações do produto, o componente presente em maior concentração no Cytopropolis Pharmanectar® é o Artepillin C®. Então, se a substancia antitumoral está presente no produto, este tem sua eficácia comprovada? Não, o que se esquece de mencionar é que todos os testes foram realizados in vitro ou em animais. Não existe nenhum teste clinico comprovando a real eficácia do Artepillin C® em humanos. Seriam necessários estudos com pacientes para que o tratamento seja comprovado e que, aí então, possa ser realmente afirmado o efeito antitumoral do produto em questão.

Um segundo ponto que vale a pena ser mencionado seria a concentração adequada para o produto fazer efeito. Nos estudos existentes sobre o Artepillin C® não existe uma padronização da dose utilizada, ou seja, não se sabe qual a quantidade que se deve tomar do produto para que ele realmente faça efeito.

O fabricante especifica que, após duas horas da utilização do produto, se tem um pico na concentração plasmática de aproximadamente 450 ng/mL de Artepillin C® e seus derivados. Como foi mencionado antes, não se tem uma concentração eficaz definida. Porém, comparando com o estudo, podemos observar que a concentração plasmática apresentada no Cytopropolis Pharmanectar® é muito inferior as utilizadas em estudos in vitro e em animais. Portanto, esse fato apenas realça a falta de estudos não só sobre a eficiência do produto, mas estudos farmacodinâmicos e farmacocinéticos, já que esse produto é vendido como um medicamento natural, uma Biochance.

Outros parâmetros importantíssimos não estão elucidados no rótulo. Do prospecto do fabricante, manda-se administrar o produto com cuidado em pacientes portadores de insuficiência renal. Francamente, se você que vai a lojas semelhantes a Mundo Verde (e choca-se com as maravilhas que esse produto promete), você vai pensar no dano renal que ele poderia causar? E mais: você, paciente com câncer, que faz quimioterapia com Paclitaxel e Fluoruracila (5-FU), dois dos medicamentos mais prescritos na oncologia, terá acesso a informação de que o Cytopropolis Pharmanectar® possui interação medicamentosa com esses medicamentos? Não vai. Não adianta que não vai. O tipo de interação medicamentosa nem é citada no rótulo. Se o Cytopropolis Pharmanectar® agir em sinergismo com a terapia oncológica, poderia aumentar os efeitos adversos, que não são poucos, e causar até a morte do paciente. Por outro lado, se inibir a terapia oncológica, podemos não ter um resultado terapêutico desejado.

Portanto, embora nutracêutico seja um termo internacionalmente reconhecido, a verdade é que ainda não existe um consenso sobre o seu significado. Diferentes órgãos regulamentadores, como a Foundation for Innovation in Medicine (FIM) e a Agência de Saúde do Canadá, possuem diferentes definições.

As companhias farmacêuticas, que priorizam o enfoque médico, parecem preferir termos como medical foods, nutraceuticals e functional foods, enquanto as indústrias de alimentos, que priorizam o enfoque nutricional nas suas campanhas de marketing, optariam por nutritional foods e functional foods. Outro conflito bem visível é que enquanto os novos alimentos visam ser vendidos no varejo farmacêutico, os novos "medicamentos" visam ser vendidos nos supermercados e outros pontos de varejo de alimentos, o que parece reflexo natural do conceito adotado para o produto: algo no meio do caminho entre alimento e medicamento.

Frente a tudo isso, portanto, parece óbvio que a construção do conceito NUTRACÊUTICO - e seus conseqüentes desdobramentos, principalmente em termos normativos - mexe com um vasto e complexo conjunto de interesses empresariais, o que complica e dificulta o processo de normatização.

BIBLIOGRAFIA

AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA - ANVISA Aprova o regulamento técnico que estabelece as diretrizes básicas para análise e comprovação de propriedades funcionais e ou de saúde alegadas em rotulagem de alimentos. Resolução nº 18, de 3 de dezembro de 1999.

AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA - ANVISA. Aprova o regulamento técnico de procedimentos para registro de alimento com alegação de propriedades funcionais e ou de saúde em sua rotulagem. Resolução nº 19, de 10 de dezembro de 1999.

AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA - ANVISA.. Aprova o regulamento técnico de procedimentos para registro de alimentos e ou novos ingredientes. Resolução nº 16, de 3 de dezembro de 1999.

BRASIL, Decreto-Lei nº 986 de 21, de outubro de 1969. Institui Normas Básicas sobre Alimentos. Diário Oficial da União, 21 de outubro de 1969.

Revista Riopharma, Ano XI, número 47, jan-fev, 2002.

CÂNDIDO & CAMPOS, . Alimentos Funcionais - Uma Revisão. Bol. SBCTA,v.29, n.2, p.107, 1995.

Comité del Codex sobre Etiquetado de Alimentos. CX/FL 98/10. Anteproyecto de recomendaciones para el uso de declaraciones de propiedades saludables. Comentarios de gobiernos en el trâmite 3. Ottawa, mayo de 1998.

DeFelice, S. L. The need for a research-intensive nutraceutical industry: what can congress do? (the claims research connection). In S. Shaw (Ed.), Functional food, nutraceutical or pharmaceutical? 15-26 p. London:IBC, 1996.

GARY et al. Food Safety and Health Claims. Food Technology, may, p.92, 1994.

GISMONDO MR; DRAGO L; LOMBARDI A . Review of Probiotics Available to Modify Gastrointestinal Flora. Int J Antimicrob Agents, v..12, n.4, p. 287, aug., 1999.

NANCY, M. Functional Foods and Market Entry. The World of Ingredients, out/nov, p. 36, 1994.

PARK, Y.K. et al. Recentes Progressos dos Alimentos Funcionais. Bol SBCTA, v.31, n.2, p.200, 1999.

PETER FÜRST. Moderated discussion. American Journal of Clinical Nutrition, v.71, n.6: 1688S-1690S, june, 2000.

ROBERFROID, M.B. What is beneficial for Health? The Concept of Functional Food. Food and Chemical Toxicology, n.37, p.1039, 1999.


-- Por Edgard Alencar & Alessandro Miranda --

7 comentários:

  1. Nome: Thiago de Paiva Garcia DRE: 107354100

    A maior falha da quimioterapia antineoplásica é devida à resistência a essas medicações. Esta resistência ocorre ou porque as populações celulares desenvolvem nova codificação genética (mutação) ou porque são estimuladas a desenvolver tipos celulares resistentes ao serem expostas às drogas, o que lhes permite enveredar por vias metabólicas alternativas, através da síntese de novas enzimas. Um caso claro é a expressão de Glicoproteína P, uma classe de enzimas associadas ao efluxo de substâncias de células e/ou tecidos.
    É também observada resistência nos casos em que o tratamento é descontinuado, quando a população tumoral é ainda sensível às drogas, em que a quimioterapia é aplicada a intervalos irregulares e em que doses inadequadas são administradas.
    Com base no trabalho e no exposto acima, fica claro que o uso irracional de um potencial antineoplásico pode levar uma resistência a esse (diminuindo a chance de utilização desse algum dia, caso a substância seja melhor estudada e inserida nos protocolos de tratamento farmacêutico), ou seja, não é apenas um mal uso pela ausência de estudos comprovando sua eficácia, mas também por um uso irracional caso esse seja de fato efetivo.

    fonte:
    http://www.inca.gov.br/conteudo_view.asp?id=101

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  2. A abordagem está excelente!!!

    O Cytoprop. deve ser tratado como apenas uma possibilidade terapêutica FUTURA. E como torná-la de fato uma realidade terapêutica? Estudos científicos? Sim, claro!!! Só que estes não podem ser gerados para atender interesse mercadológico! Quero ver um multicêntrico triplo-cego (sim, triplo!!!) ser feito. O grande problema é utilizar informações fracas - e provavelmente tendenciosas- para vender algo. E aí já sabemos...não tem conteúdo? Faça marketing!

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  3. Esse produto em foco no trabalho é um ótimo exemplo da ciência servindo diretamente ao mercado. A literatura é capaz de corroborar muitas substâncias, basta ter acesso ao portal capes e procurar a informação que você deseja e sobre a ótica que você deseja. Para registrar um produto tão promissor como esse, é possível encontrar o necessário nessa literatura. Nem precisa colocar na balança os prós e contras. O marketing compensa as dúvidas técnicas que possíveis consumidores possam ter.

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  4. A indústria gosta de brincar com a ingenuidade das pessoas a fim de lucrar cada vez mais. É um absurdo a falta de estudos mais aprofundados sobre este produto não inibirem sua venda. Os órgãos regulatórios deveriam enfatizar a fiscalização desses ditos nutracêuticos milagrosos. Ainda mais pelos riscos potenciais que este produto apresenta, principalmente por sua capacidade de interagir com os principais tratamentos anti-tumorais. Definitivamente, o desespero de um paciente com o diagnóstico do câncer passa por cima de qualquer informação com base científica, a fim de ser curado desta doença, com a primeira substância milagrosa que aparecer pela frente. É um desrespeito com os pacientes além de uma falta de ética tamanha!

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  5. É difícil de aceitar que um produto com todas as características atraentes para um consumidor seja registrado como alimento, e não possua os alertas necessários em relação a eventos adversos que possam ocorrer. Esses produtos nutracêuticos possuem indicações ,que um medicamentos só poderia ter após passar por vários ensaios que garantam a eficácia e a segurança . O que não é o caso Cytopropolis Pharmanectar, pois não foram realizados ensaios em humanos, e principalmente pessoas que possuem câncer , as quais já se encontram debilitadas. Achei muito bom o trabalho principalmente os alertas aos benefícios que esse produto diz ter e que não é bem assim.

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  6. Eu estou utilizando o cytopropolis por indicação de um ginecologista homeopata, por causa das suas propriedades fungicidas e para fortalecimento da minha resistencia do organismo.

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  7. Eu estou utilizando o cytopropolis por indicação de um ginecologista homeopata, por causa das suas propriedades fungicidas e para fortalecimento da minha resistencia do organismo.

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