Goma carragena
As gomas têm sido aplicadas na indústria de
alimentos por serem capazes de atuar como agentes gelificantes, doadores de
viscosidade, agentes de suspensão, e principalmente, para fins emulsificantes,
estabilizantes e espessantes, isso devido a capacidade intrínseca de gelificar.
São classificadas polissacarídeos, e podem ser
oriundas das mais diversas fontes, como vegetais, exsudato e sementes de
plantas, produtos de biossíntese de microorganismos, e organismos marinhos como
as algas. Utilizadas comercialmente nos mais diversos setores industriais, são
indispensáveis na produção de diversos produtos alimentícios, por contribuírem
para o espessamento, gelificação, estabilização, e formação de filme, além de
atuarem como agentes auxiliares de processamento. Vale dizer que a estrutura
das moléculas de polissacarídeos presente nas gomas lhes permite ter
propriedades diferentes, a depender da fonte de onde foi extraída, de modo que
diferentes gomas em proporções iguais apresentam propriedades reológicas
diferentes, isso quer dizer que, as gomas como moléculas relativamente lineares
como a goma tragacanto ou a adraganta, formam soluções mais viscosas se
comparadas as gomas de forma esférica, como a goma arábica por exemplo. Já as de
cadeia ramificadas formam géis com facilidade e são altamente estáveis, visto
que as ramificações impedem que ocorram interações intermoleculares. Algumas
gomas com ramificações e estrutura linear e longa têm propriedades mistas. No
geral, as propriedades mais importantes de uma solução de goma são a água
ligada, viscosidade em termos de gelatinização e capacidade espessante.
No grupo das gomas oriundas de
exsudatos de plantas terrestres, pode-se elencar a goma arábica (também chamada
de acácia), goma karaya, goma adraganta e goma ghatti. Já dentre as gomas
extraídas de sementes de plantas terrestres estão a goma locusta, jataí ou LGB
e a goma guar. As gomas extraídas de plantas marinhas incluem os alginatos, a
goma agar e a goma carragena. As gomas obtidas a partir de processos
microbiológicos, goma xantana e a goma gelana. E no grupo das gomas obtidas por
modificação química de produtos vegetais, destacam-se as modificações químicas
da celulose e da pectina, que conduzem à obtenção e coloides com porpriedades
gelificante.
A
carragena é um grupo de polissacarídeos estrutural presente células de algas do
filo Rhodophyta, as quais possuem aplicabilidade no setor alimentício para fins
emulsificante, geleificante, estabilizante, capaz de manter partículas em
suspensão, controlar fluidez e conferir sensação tátil bucal de gordura.
Os gêneros mais usados para extração da goma
carragena, e que crescem em águas frias, são as Gigartina, Chondrus e Iridaea;
e as pertencentes à família Gigartinaceae do gênero Euchema e Hypnea, pertencem
respectivamente, às famílias Solieriaceae e Hypneaceae, e nascem em águas mais
quentes.
Dentre os usos da carragena na indústria
alimentícia, pode-se citar a produção de sobremesas do tipo gelatina, sucos de
frutas, geléias e marmeladas, carnes processadas, sobremesas gelificadas de leite,
produtos lácteos, emulsões lácteas, produtos lácteos fermentados e na produção
de cerveja.
É possível separar a carragena em diferentes
três tipos a partir das propriedades fisico-químicas, sendo carragenas do tipo
Kappa (κ -
capaz de formar um gel rígido, quebradiço, termoestável, apresenta sinérese -
extrusão espontânea de água através da superfície do gel em repouso -, e tem
alta força gelificante) e Lambda (λ - solúvel a frio, não gelificante e doadora de
viscosidade), comum as Gigartinaceae, enquanto as Solieriaceae produzem
carragenas do tipo Kappa (κ) e lota (ι - forma gel elástico, termorreversível, não apresenta sinérese e
propriedade tixotrópica). Há, também, uma diferenciação adicional e menos
usual, a qual classifica a partir do número, posição dos grupos sulfatos e,
presença de ligação 3’,6’-anidro entre os resíduos D-galactopiranosilos. Vale
salientar que, maiores níveis de éster sulfato culminam em menor força de
gelificação e baixa temperatura de solubilização.
A capacidade de formar géis estáveis
característico do tipo Kappa e lota por meio do resfriamento é inerente a
formação da formação estrutural dos polímeros em da dupla hélice, o quais se
organizam de maneira aleatória quando estão submetidos em condições de
temperatura superior a temperatura de fusão do gel. Quando resfriado, os
polímeros formam rede tridimensional na qual as duplas hélices constituem os
pontos de junção das cadeias do polímero. A presença de alças na cadeia bem
como o número, tipo e posição dos grupos de éster sulfato têm efeitos
importantes nas propriedades de gelificação.No entanto, as carragenas do tipo kappa
e lota formam gel em água somente na presença de sais de potássio ou cálcio,
porém não são necessários em leite.
A aplicação das carragenas na indústria de
alimentos, é principalmente no setor de laticínios uma vez que a carragena,
diferente dos demais colóides supracitados, é a capacidade de interagir com as
proteínas presentes no leite a partir de interações eletroestáticas que ocorrem
entre as cargas negativas do éster de sulfato da carragena e a caseína, que é
positivamente carregada, presente na micela do leite. Uma segunda forma de
interação entre as proteínas do leite com os grupos ésteres de sulfato da
carragena e os resíduos carboxílicos presentes nos aminoácidos. Essa
reatividade depende de fatores como a concentração de carragena, o tipo de proteína,
temperatura, pH e o ponto isoelétrico da proteína. Tal reatividade da carragena
com as proteínas do leite adjunto a capacidade intrínseca de formação de gel
confere um bom efeito estabilizante e gelificante de produtos lácteos.
Quanto
a capacidade de agir como doador de viscosidade da carragena, se deve a
concentração do colóide, do tipo de carragena, da temperatura, presença de
outros solventes no meio, e o peso molecular; quanto maior o peso molecular,
maior concentração do colóide e menor temperatura da solução, maior é a
viscosidade.
A Resolução da Diretoria Colegiada - RDC Nº 45,
de 3 de novembro de 2010 dispõe de
informações sobre os aditivos alimentares autorizados para uso segundo as Boas
Práticas de Fabricação (BPF), e também, classifica a carragena como agente
emulsionante, gelificante, espessante (doador de viscosidade) e estabilizante.
Define o limite máximo permitido em alguns alimentos, como por exemplo, para
massas alimentícias secas com ovos, com ou sem vegetais verdes, tomate, pimentão
ou outros 0,8 g em 100 g (como peso do
extrato seco desengordurado do leite), somente para massas preparadas com leite
de carragena, atuando nesse produto como estabilizante e emulsificante.
.
A RDC Nº239, de 26 de julho de 2018, estabelece
os aditivos alimentares e coadjuvantes de tecnologia autorizados para uso em
suplementos alimentares e também lista os limites máximos e condições de uso. E
também, estabelece limites máximos e condições de uso dos suplementos
alimentares indicados para lactentes ou para crianças de primeira infância, os
aditivos alimentares autorizados, nas suas respectivas funções. A goma em
questão, só é considerada para alimentos suplementares em formas de consumo
sólidas ou semisólidas, incluindo drágeas, cápsulas gelatinosas, cápsulas,
granulados, pastilhas e formas mastigáveis, podendo ser usada com objetivo
glaceante, ou seja, conferir aparência brilhante ou adicionar um revestimento
protetor.
No entanto, a resolução CNS/MS nº4, de 24 de
novembro de 1988, lista as concentrações máximas permitidas para aditivos
intencionais, dentre essas, a concentração máxima de carragena em g/100g ou
g/100mL como espessante em alimentos como creme de leite esterelizado (0,50 g),
coberturas e xaropes para gelados e comestíveis (0,50g), cobertura para saladas
(0,50), sobremesa e pós para sobremesa de gelatinas, flans, pudins e similares
(50g no p.s.c), leite gelificado (0,50g), entre outros.
Deste modo, conclui-se que as gomas têm
diferentes aplicabilidades na indústria de alimentos, sendo a carragena
utilizada principalmente na produção de produtos lácteos, e devido a sua
estrutura molecular, esse hidrocolóide tem 4 funções/aplicabilidades. E também
é possível concluir que segundo a legislação para o uso desses aditivos, apesar dos limites descritos na resolução
CNS/MS nº4, durante a pesquisa na literatura, não foi observada qualquer
relação entre os limites estabelecidos e a carragena; bem como a grande maioria
dos espessantes não têm limite máximo de ingestão estabelecido por quantidade de
alimento, somente a indicação quantum satis (quantidade suficiente). De mesma
maneira que a maioria dos espessantes e/ou estabilizantes não tem ingestão diária aceitável especificada, o que significa que eles não têm
um valor limitante estabelecido porque apresentam níveis de toxicidade muito
baixos, não representando perigo à saúde.
Referências:
AS Grandes Gomas. Revista Aditivos e Ingredientes, nº 79, 2011.
ANVISA. AGENCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA. Resolução da diretoria colegiada- RDC nº 239, de 26 de julho de 2018.
ANVISA. AGENCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA. Resolução da diretoria colegiada- RDC nº45, de 03 de novembro de 2018.
A partir do término da leitura da postagem, principalmente do último parágrafo, é possível inferir que a carragena, utilizada como aditivo alimentar, não apresenta nenhum risco à saúde. Entretanto, a partir de pesquisas bibliográficas, nota-se o uso de modelos experimentais de indução da inflamação utilizando-se carregena/carragenina. François Nantel et.al, no artigo intitulado “Distribution and regulation of cyclooxygenase-2 in carrageenan- induced inflammation” publicado em 1999 pelo British Journal of Pharmacology menciona que a carragena causa edema e hiperalgesia na pata traseira de ratos, o que está associado ao aumento dos níveis de COX-2 e PGE2. Outros estudos utilizando o modelo de inflamação induzido por carragena em ratos atribuíram a inflamação ao aumento da liberação de óxido nítrico. Como a carragena é um aditivo alimentar, decidi procurar sobre os impactos intestinais que poderiam ser causados pela substância. A partir disso, encontrei informações de que a carragena, assim como a carbometilcelulose, induz características histopatológicas em modelos animais semelhantes aquelas encontradas na doença inflamatória intestinal, com alteração da microbiota, ruptura da barreira epitelial intestinal, estímulo a citocinas pró-inflamatórias e inibição de proteínas que fornecem proteção contra microorganismos. O mesmo estudo diz que o resultado visto em células animais foi visto em estudos com células epiteliais e microbiota de humanos. Dessa forma, pode ser que esse aditivo alimentar não seja completamente isento de riscos à saúde, principalmente em relação a indivíduos susceptíveis a doenças intestinais. Abaixo, deixarei os artigos que li sobre o assunto comentado.
ResponderExcluirOmote, K.; Hazama, K.; Kawatama, T.; Kawatama, M.; Nakayaka, Y.; Toriyabe, M.; Namiki, A. Brain Research, 2001, 912, 171
François, N.; Denis, D.; Gordon, R.; Northey, A.; Cirino, M.; Metters, K.M.; Chan, C.C., British Journal of Pharmacology, 1999, 128, 853
Salvemini, D.; Wang, Z.; Wyatt, P.S.; Bourdon, D.M.; Marino, M.H.; Manning, P.T.; Currie, M.G. British Journal of Pharmacoloy, 1996, 118, 829
Martino, J.V.; Limbergen, J.V.; Cahill, L.E. Frontiers in Pediatrics, 2017, 5, 96